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Baesa e ONGs usam ferramenta para diminuir dano ambiental em Barra Grande


O jeito mais eficaz de destrinchar uma polêmica sem tomar partido é relatar os fatos desde o início. A história da Hidrelétrica de Barra Grande, que está sendo construída pelo consórcio Baesa - formado pelas empresas Alcoa, Votorantim, Camargo Corrêa, CPFL e DME Energética - começa em 1998, quando o Ibama permitiu que os empresários construíssem a usina no terreno que fica entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O atestado dado pelo órgão à época simplesmente não mencionou que o terreno tinha uma floresta de mata araucária de 6 mil hectares.A floresta precisaria ser extinta para erguer a usina e isto só se descobriu há cerca de um ano, quando o muro de concreto já estava pronto e foi feito o pedido para encher as comportas. A polêmica estava instalada. De um lado, empresários com um atestado nas mãos que lhes conferia o direito legal de construir; de outro, membros da sociedade civil lutando para preservar o que nos resta de flora. Mas o movimento de responsabilidade social está ajudando a contar esta história de modo diferente. Capacitados pelo Ibase, os membros das ONGs Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e Terra de Direitos aprenderam a lançar mão de uma ferramenta nova, chamada Diretrizes da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). São recomendações voluntárias, moralmente obrigatórias, sobre a atuação de empresas transnacionais. E é assim que, pela primeira vez no Brasil, empresas e sociedade civil terão uma espécie de mediador de diálogo oficial, o Ponto de Contato Nacional (PCN), cujo papel é aumentar a efetividade das diretrizes da OCDE. O Brasil, como um dos países signatários da organização desde 2000, se compromete a fazer cumprir suas diretrizes. O grau de cumprimento delas dependerá da vontade e capacidade dos PCNs, que têm liberdade para aceitar ou não reclamações da sociedade contra as empresas. A novidade é que, depois de uma reunião que durou três horas no meio do mês passado, a direção do PCN decidiu aceitar a queixa feita pelas ONGs contra a Baesa. Começa aí a tarefa diplomática da representante do PCN Ângela de Freitas, que fica em Brasília e também chefia o gabinete da Secretaria de Assuntos Internacionais. É preciso deixar claro para as empresas que elas serão cobradas, mas que apesar de ser oficial, o PCN não tem nenhum poder judiciário, muito menos de polícia. ---- Vamos analisar, chamar as partes, ouvir o Ibama, a Aneel, vários órgãos que estão envolvidos. A maior preocupação dos atingidos pela barragem é que os acordos sociais sejam cumpridos pela empresa. Vamos atuar como mediadores. Não temos um tribunal, não multamos. Nossa única arma é a informação. Nenhuma empresa vai querer ver o nome dela envolvido numa situação incômoda como esta. E o PCN dá ciência do que está sendo discutido ao mundo inteiro. No caso da Baesa, segundo Guillherme Eidt, da ONG Terra de direitos, uma vez constatado que o crime ecológico foi cometido, não é mais o caso de punir o culpado proibindo o funcionamento da hidrelétrica. Isto a transformaria num elefante branco: --- Estamos certos de que o Estudo de Impacto Ambiental dado em 1999 para a Engevix, empresa que fez o projeto, foi precário. Ainda que não tenha sido a Baesa que fez o estudo, ela tinha que ter tido ética para passar as informações adiante. Não é possível que, durante a construção, os técnicos não tivessem visto a mata no entorno. Mas nossa intenção agora é garantir o controle social da mitigação do erro. E lutar para que este tipo de conduta das empresas transnacionais não se torne uma rotina --- diz. O representante da Baesa, Carlos Miranda, afirma que isto está sendo feito. Garante que a empresa está gastando mais de R$ 30 milhões na compensação sócio-ambiental. --- Tomamos a licença dada pelo Ibama em 99 como um atestado. Talvez tenha sido superficial, mas os dois inventários são trabalhos técnicos. O que se tem que evitar é o radicalismo. Muitos membros das ONGs ambientalistas queriam deixar a hidrelétrica inacabada. Ora, isso poderia causar uma catástrofe. Para demolir o que já foi feito, seria preciso gastar R$ 3,5 bilhões. Só que esta quantia iria ser lançada como despesa e a União é que teria o prejuízo. Outros representantes das ONGs dizem que toda a floresta vai ficar debaixo dágua, mas isso não é verdade: só 0,8% da floresta é que será prejudicado dessa forma. O QUE É OCDE? É uma organização criada em 1961 por 30 países membros e alguns signatários, entre eles o Brasil. A missão da OCDE, que tem sede em Paris, é contribuir para o desenvolvimento nos países industrializados e também naqueles em vias de desenvolvimento. Polêmica e nuances: é só o começo Como se vê, o pessoal do PCN terá muito trabalho. O tema é polêmico e tem várias nuances. Os ambientalistas afirmam, por exemplo, que a energia gerada pela hidrelétrica será usada apenas para alimentar a fábrica de alumínio CBA. --- Não somos contra a energia, mas questionamos a forma como ela é produzida - diz Marco Antonio Trierveiler, coordenador nacional do MAB. Carlos Miranda confirma: a energia de Barra Grande será realmente usada para a produção de alumínio. Mas garante que ainda assim a comunidade será beneficiada: --- As fábricas de alumínio têm direito de consumir energia do país. Quando elas geram sua própria energia, não só não estão consumindo a do país como também serão capazes de fornecer o que sobra para a comunidade do entorno. Ângela de Freitas diz que não pode dizer qual será o desfecho da contenda. Ela agora vai reunir a maior quantidade possível de documentos e começar a chamar outros órgãos para conversar. Mas o melhor de tudo é que o PCN está começando a acontecer e a virar realidade. - Estou consciente de que o governo pode fazer ainda mais. Mas estamos no começo. Autor/Fonte: Amélia Gonzales / Jornal O Globo - Caderno Razão Social - 01/08/2005 / http://oglobo.globo.com/j




Eixos: Democratização da justica e garantia dos direitos humanos