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Alto Acará: a Vale S.A. e a violação de direitos de comunidades quilombolas


Os conflitos fundiários e a luta recorrente pelo direito à terra são realidades na vida das comunidades quilombolas das regiões Oeste e Nordeste do Pará. A região, marcada pela expansão de grandes empresas, vem sendo prejudicada pela ação desses investidores que, a fim de obter mais lucros, violam os direitos das comunidades locais.

A comunidade quilombola Alto Trombetas, na região do Oriximiná, com a Mineração Rio Norte é exemplo disto. José Carlos Galiza, representante da Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará (Malungu), explica melhor estes conflitos no artigo "Alto Acará: a Vale S.A. e a violação de direitos de comunidades quilombolas", publicado no caderno “Empresas e violações de direitos: Esse lucro não é direito”.

Elaborado pela Terra de Direitos, o caderno tem como objetivo reafirmar a importância da construção de uma efetiva política pública para a proteção de defensoras e defensores de direitos humanos, partindo de uma reflexão crítica a respeito dos avanços e desafios enfrentados em sua implementação.

>> Clique aqui para acessar o caderno na íntegra

Confira o artigo:

Alto Acará: a Vale S.A. e a violação de direitos de comunidades quilombolas

Entrevista com José Carlos Galiza, da Malungu
Por Franciele Petry Schramm, assessora de comunicação da Terra de Direitos

As comunidades quilombolas das regiões Oeste e Nordeste do Pará são marcadas pelos constantes conflitos que as cercam. Diariamente, vêem sua cultura e seus territórios ameaçados pela ação de grandes empresas, que buscam aumentar seus lucros a partir da violação do direito do próximo.

Exemplo disso é a batalha travada entre a comunidade quilombola Alto Trombetas, na região do Oriximiná, com a Mineração Rio Norte. A empresa invade terras da comunidade para a exploração de bauxita, um minério utilizado como matéria prima para a produção de metais.

A mesma violação de direitos de quilombolas e outros povos tradicionais pode ser observada também na Ilha de Marajó. O plantio de arroz em larga escala toma áreas de ribeirinhos e pescadores, e já resultou na morte de lideranças que denunciaram ações de empresários.

Caso semelhante acontece no Território Quilombola Alto Acará. O plantio de dendê – fruto do dendezeiro que produz grande quantidade óleo e é utilizado para a produção de biodiesel – avança em terras já delimitadas como de comunidades. A Vale, empresa criada em parceria entre a mineradora Vale S.A. e a canadense Biopalmas, está no pano de fundo dos conflitos.

Para falar sobre a situação, conversamos com José Carlos Galiza, representante da Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará (Malungu). A Malungu vem acompanhando os conflitos no território Alto Acará e presta assessoria jurídica aos habitantes do local.

Terra de Direitos: De que forma os direitos dos habitantes do Território Quilombola Alto Acará estão sendo violados?
José Carlos Galiza: A Vale vem tomando o território das comunidades quilombolas para a plantação do dendê e produção do Biodiesel. Além de invadir o território, a empresa também faz toda uma campanha para incentivar a plantação da monocultura do dendê. Com isso, pequenos produtores estão deixando de trabalhar com atividades tradicionais da região, como o plantio da pupuia ou a coleta do açaí. Muitos produtores estão perdendo as terras para a monocultura – estão plantando dendê ou vendendo suas propriedades para empresas que plantarão as palmeiras. E o monocultivo não é bom para o pequeno produtor.

Temos, de um lado, a Vale entrando no território quilombola; por outro, entram os madeireiros que vão devastando uma parte da comunidade. Depois de limpa, tentam negociar as terras com a empresa.

Assim, direitos previstos em tratados internacionais são violados. Com as invasões, a Vale não leva em conta a Convenção 169 da OIT [Organização Internacional do Trabalho], pois não há consulta prévia para obter a permissão de entrar no território para plantio ou pesquisa. É um desrespeito a um tratado internacional e a comunidade, ao mesmo tempo.

Mas essa situação vai além da questão territorial. O desmatamento, por exemplo, afeta também a questão ambiental.

É como se as comunidades tradicionais e sua cultura, atrapalhassem o desenvolvimento do país. Parece que é preciso desmatar, produzir monocultura para que o país se desenvolva.

Já houve mortes em área de posseiros e em outras áreas de conflitos com os madeireiros. E, geralmente, quando acontecem os assassinatos, a polícia não usa como justificativa o conflito por território. Os crimes acontecem de uma forma que são apontados como crimes passionais. É tudo mascarado.        

Quais ações são tomadas para combater a exploração inapropriada da terra?

Estamos com um processo de titulação do território há cinco anos. Parte das terras pertence ao estado e a União; a área quilombola já chegou a ser delimitada pelo Instituto de Terras do Pará (Iterpa) e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

A Vale alega que comprou as terras e apresenta documentos que, segundo o Instituto de Terras do Pará (Iterpa), são válidos, mas não incidem nas comunidades.Tais documentos são relativos a terras que estão a cerca de 60 km de distância do território quilombola.

Por isso a comunidade tem toda uma ação com o Ministério Público Federal (MPF) e com a Advocacia Geral da União (AGU), no sentido de rever essas áreas. Mas há uma lentidão da justiça em tentar regularizar o território da comunidade.



Ações: Quilombolas, Empresas e Violações dos Direitos Humanos

Eixos: Terra, território e justiça espacial