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STF garante proteção à Unidades de Conservação, mas não afasta perigo de Hidrelétricas no Tapajós (PA)


O julgamento é visto como vitória parcial, na medida em que o planejamento de hidrelétrica já serve para reduzir as Unidades de Conservação. 

*Por equipe de comunicação, com contribuição de Pedro Martins

Foto: ICMBio

Em julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.717, sobre a possibilidade de redução de Unidades de Conservação (UC) através do caso concreto da edição da Medida Provisória nº 558/2012, convertida na Lei nº 12.678 de 2012, o colegiado do Supremo Tribunal Federal  (STF) decidiu, por unanimidade, na última quinta-feira (05), pela inconstitucionalidade da supressão do patamar de proteção ambiental via medida provisória.

Ocorre que o STF decidiu pelo não pronunciamento de nulidade dos dispositivos da Medida Provisória nº 558 de 2012 contestados na ADI, ou seja, manteve na prática a diminuição de áreas protegidas na Amazônia. No entanto, a Medida Provisória 558/2012 havia reduzido sete diferentes Unidades de Conservação no Bioma Amazônico, cada uma em situação específica.

“Qualquer decisão aqui, pela procedência ou improcedência não vai descaracterizar o que já está feito desde a edição da medida provisória” afirmou a ministra relatora, Carmen Lúcia, em seu voto, que considerou os alagamentos provocados pelas Usinas Santo Antônio, Jirau e Tabajara. No entanto, a Usina Hidrelétrica (UHE) Tabajara não possui ainda licença de instalação.

O Supremo admitiu que o planejamento governamental para o estabelecimento de empreendimentos, tais como as hidrelétricas de São Luiz do Tapajós e Jatobá ambas previstas no Rio Tapajós, Oeste do Estado do Pará, apresentam danos irreversíveis, e ainda considerou que para haver o licenciamento ambiental de tais empreendimentos é preciso desafetar as áreas das UCs impactadas.

Segundo o assessor jurídico da Terra de Direitos, Pedro Martins, que acompanha o caso, a decisão se configura como uma vitória parcial. “Ganhamos apenas parcialmente. Foi importante ter uma decisão do STF em que se postula o princípio da vedação ao retrocesso socioambiental, e mesmo do princípio da reserva legal para as propostas de redução de Unidades de Conservação, com especial apreço ao Bioma Amazônico e aos mecanismos de combate ao desmatamento, mas, na prática, o STF decidiu que ‘as circunstâncias irreversíveis’ podem ter qualquer natureza, desde o planejamento elétrico nacional até um processo administrativo de licenciamento ambiental” diz.

Ele ainda complementa que a incidencia da sociedade no julgamento fez destaque aos danos irreparáveis. “Ressaltamos diversas vezes, desde a petição de Amicus Curiae, na sustentação oral, até nos memoriais, de que não existem danos irreparáveis para as UCs do Tapajós. O STF invisibilizou a Amazônia, invisibilizou o Tapajós no julgamento desta ADI”, complementa Pedro.

 

Entenda o caso
Em 2012, a Procuradoria Geral da República (PGR) ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a Medida Provisória 558/2012, editada por Dilma Roussef para alterar o tamanho de três parques nacionais, uma área de proteção e três florestas nacionais no Bioma Amazônico. As alterações seriam justificadas para que pudessem ser construídas cinco usinas hidrelétricas no norte do país. Tramitando em regime de urgência, a Medida Provisória foi transformada na Lei Federal nº 12.678 no mesmo ano.

Na ADI, a PGR alega descumprimento do princípio da reserva legal por haver expressa determinação na Constituição Federal que redução de Unidade de Conservação só pode ocorrer por via de Lei, em sentido material e formal. Alegou-se também violação do princípio da precaução e prevenção, tendo em vista que a via processual legislativa de edição de MP, bem como de sua conversão em Lei não garantem apreciação técnica suficiente para analisar os impactos das reduções de proteção ambiental o que violaria o art. 225 da CF, além desses, ressaltou-se o princípio da vedação ao retrocesso socioambiental já admitido pela Suprema Corte.

Durante a tramitação processual, ingressaram na Ação na qualidade de Amici Curiae a Agencia Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) por entender que decisão no caso afetaria o Planejamento Energético Nacional, e a Terra de Direitos para subsidiar o julgamento com elementos factuais e a discussão sobre violação de Direitos Humanos no contexto do licenciamento ambiental de Usinas Hidrelétricas na Amazônia.

Após o aditamento da Ação em razão da conversão da MP em Lei, a PGR peticionou requerendo a modulação dos efeitos do julgamento entendendo a diversidade de situações que compreendem as 07 Unidades de Conservação, e que naquele momento a UHE São Luiz do Tapajós já tinha seu processo de licenciamento ambiental arquivado pelo IBAMA.

Em agosto de 2017, a ADI entrou em pauta de julgamento, tendo naquele momento a sustentação oral realizada pela Advocacia Geral da União (AGU) e pela Organização de Direitos Humanos Terra de Direitos, além da leitura do voto da Ministra Relatora Carmen Lúcia.

Votação
Foto Carlos Moura/Supremo Tribunal Federal

Em seu voto, a ministra Carmen Lúcia se apoiou na aplicação do princípio da proibição de retrocesso social, que, de acordo com o voto da Ministra, impede de que núcleo essencial de direitos sociais já efetivado por medidas legislativas seja aniquilado por medidas estatais. Arguiu-se ainda que o princípio da proibição de retrocesso socioambiental, embora não expressamente previsto na Constituição, assume condição de princípio geral à luz do qual deve ser analisada a legitimidade das medidas legislativas que objetivem reduzir o patamar de tutela legal do meio ambiente.

A ministra identifica que para a edição da MP 558 e conversão na Lei nº 12.678 de 2012 não foi respeitado o meio processual legislativo próprio para a proteção do meio ambiente. Por fim, julgou conhecendo parcialmente da ADI, em razão da perda de objeto dos artigos 6º e 11 da MP (que tratava de atividades minerárias) e do art. 20 da Lei, declarando, na parte conhecida, a inconstitucionalidade, porém sem pronunciamento de nulidade. Em comentários durante o julgamento, respondendo a questão levantada pelo ministro Gilmar Mendes, a ministra reafirma que a Medida Provisória se mantém na íntegra.

Na data de 05 de abril de 2018, o julgamento é retomado em clima de “ressaca” como afirmou o ministro Luiz Roberto Barroso - posto ter acontecido no dia seguinte à votação do habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - e assim se resume a breves comentários dos 08 ministros presente em sessão.

Já o ministro Alexandre de Moraes proferiu seu voto-vistas acompanhando a relatora, ressaltando que o julgamento seguia sem pronúncia de nulidade, nas palavras do Ministro, “em virtude de todas essas áreas terem sido alagadas”, pontou Alexandre. Ele também ressaltou que o julgamento deixa fixada a inconstitucionalidade da edição de medida provisória para redução de Unidades de Conservação, ou seja, para rebaixar o patamar de proteção ambiental.

Seguiram em ordem de votação os ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Dia Toffoli e Marco Aurélio, todos acompanhando o voto da relatora. O ministro Ricardo Lewandowski, que também acompanhou a relatora, pediu para consignarem um obiter dictum (parte da decisão considerada dispensável) sobre a modulação dos efeitos da decisão entendendo a realidade fática como insuperável.

Unidades de Conservação e os Projetos Hidrelétricos no Tapajós
Das 07 Unidades de Conservação, 05 estão localizadas na região do Rio Tapajós, Oeste do Pará, são elas o Parque Nacional da Amazônia, as Florestas Nacionais Itaituba I, Itaituba II e Crepori, e a Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós. A justificativa utilizada para a redução está no planejamento de duas usinas hidrelétricas, a São Luiz do Tapajós cujo processo de licenciamento ambiental se encontra arquivado pelo Gabinete da Presidência do IBAMA em despacho de 04 de agosto de 2016, e a UHE Jatobá que não tem licença de instalação concedida.

As Flonas Itaituba I e II perderam um total de 35 mil hectares, a APA do Tapajós foi reduzida em cerca de 20 mil hectares e a Flona Crepori em 850 hectares. Essas áreas são fortemente pressionadas por garimpos ilegais e grandes empresas de mineração. Foi feita em plenário durante sustentação oral a ressalva sobre as flonas Itaituba I e II por estarem sobrepostas a Terra Indígena Sawre Muybu do povo Munduruku. Em contradição, a Suprema Corte decide se afastando das circunstâncias factuais, mas impactam consideravelmente estas mesmas circunstâncias. O contexto do Parque Nacional da Amazônia é outro.

“No caso especifico do Parque Nacional da Amazônia, a Comissao Pastoral da Terra  e o Sindicato dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Rurais (STTR) de Itaituba veem se articulando para que a o Art. 3º da Lei nº 12.678/12 torne-se realidade e que as áreas desafetadas do Parque Nacional da Amazônia sejam destinadas para o estabelecimento da reforma agrária na região do Tapajós. Essas áreas desafetadas como mencionada na Lei devem ser destinadas em Projetos de Assentamento Sustentáveis, a serem criados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA”, relata a agente da Comissao Pastoral da Terra (CPT) BR 163,  Elmara Guimarães.

Ela ainda destaca que mesmo apos cinco anos de sançao da Lei, o Incra não instituiu assentamentos na area afetada. “Acompanhamos o trabalho do Incra nos anos de 2016 e 2017 que iniciou a vistoria na área desafetada, porém, apesar de já ter finalizado os trabalhos até o momento o orgao não se posicionou em relação a criação dos assentamentos. Nós, a CPT e o STTR de Itaituba continuamos lutando para que sejam instituídos os 5 PDS’s e 1 PA nessas áreas desafetadas”, complementa Elmara.

 

 

 

 

 

 

 



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