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No Brasil, mulheres morrem todos os anos por defenderem direitos humanos


Via Comite Brasileiro de Defensoras e Defensoras de Direitos Humanos.

No campo ou na cidade, são altíssimos os números de mulheres defensoras de direitos humanos assassinadas em decorrência das suas lutas. A grande maioria, negras e pobres, combate o mesmo projeto genocida que Marielle denunciava, transformando suas vidas em luta por milhares de pessoas pobres e excluídas do acesso à direitos básicos.

O fato de Marielle ser uma mulher negra, lésbica e periférica não é secundário quando se analisa as razões de sua morte. Mulheres que ocupam lugares de destaque na política são sempre lembradas, de uma forma ou de outra, que aquele espaço não poderia ser ocupado por elas. Essa ousadia tem de ser punida. Uma mulher, negra, periférica, feminista, 5ª vereadora mais votada da segunda maior capital do país e que, ainda, denunciava a violência contra as periferias?

Foto: Mídia Ninja

 

Marielle se afastava do discurso raso e simplista da violência no Rio de Janeiro e enfrentava a raiz do problema, denunciando as grandes máfias que lucram e se fortalecem com toda essa barbaridade. Denunciava que essa fatídica guerra às drogas só serve para encarcerar e matar, ainda mais, o povo negro, que o exército e os militares, agora legitimados por uma injustificável intervenção federal, estão ali para defender interesses que não são públicos. Ela, mulher-coragem, denunciava as atrocidades que as forças de segurança pública cometem contra seu povo, lutava por creche, pois entendia, com tanta lucidez, que essa era uma pauta central para o feminismo. Marielle era (É!) uma referência de compromisso e luta pelos direitos humanos.

Com sua morte, é impossível não lembrar de tantas outras lutadoras que, como ela, foram brutalmente silenciadas e seguem esquecidas na nossa história tão recente. Lideranças quilombolas, como Francisca das Chagas (Maranhão) e Maria Trindade (Pará) também foram assassinadas em 2016 e 2017, respectivamente. Elas lutavam por seus territórios, pelos direitos dos povos do campo e da floresta e contra o racismo que os exclui do acesso à terra desde a colonização. Lutavam por direitos humanos e enfrentavam grandes poderes materializados nos interesses econômicos e políticos do agronegócio, expansão e manutenção dos latifúndios e dos grandes empreendimentos que destroem os bens naturais e modos de vida tradicionais.

Nilce de Souza Magalhães, a Nicinha, liderança do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) teve sua vida ceifada enquanto defendia os direitos das comunidades atingidas pelas hidrelétricas no Rio Madeira, em Rondônia. Geovana Teododo, indígena Kaigang e Sônia Vicente Cacau Gavião, “Cry Capric” também foram assassinadas enquanto lutavam pela demarcação de seus territórios.
Somos muitas em defesa dos direitos humanos e, em decorrência, somos muitas e muitos sendo assassinadas e ameaçadas. Desde 2015 que a violência contra defensoras, militantes e lutadoras pelos direitos humanos cresce no Brasil. São diversos os conflitos, prisões arbitrárias, violências em manifestações populares, despejos forçados e assassinatos que se multiplicam de norte a sul do país, e se agravam ano após ano. Os algozes são inúmeros e se manifestam tanto como agentes públicos, quanto como agentes privados, e sentem-se cada vez mais seguros, autorizados e encorajados a enfiar seu projeto de poder goela abaixo, mesmo que para isso tenham que matar.
Além disso, crimes de ódio se intensificam no Brasil, como os atentados e violências contra populações LGBTI, pauta também centralmente defendida pelo mandato de Marielle.

Só no ano de 2017 foram 179 assassinatos de travestis mulheres, transexuais e homens trans no Brasil, segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais – Antra. Em 2018 esse número já é de 40.
Neste contexto, é importante lembrar que 2017 foi marcado pelo fortalecimento de discurso de ódio, utilizados para censurar exposições em museus e ataques a universidades públicas. Ao menos três professoras da Universidade Federal da Bahia (UFBA) foram ameaçadas em decorrência de suas pesquisas e um estudante teve que solicitar apoio de segurança da própria Universidade para defender sua dissertação de mestrado que versava sobre gênero e sexualidade.

Todos estes fatos não podem ser analisados de forma isolada. O assassinato de Marielle Franco expõe um estado de violência no Brasil que tem destino certo: são as pessoas negras, pobres, quilombolas, indígenas, sem terra, lésbicas, gays, transexuais, travestis, moradoras e moradores em situações de rua que estão sendo atacados e assassinados no Brasil.
É por tudo isso que, nossa luta não tem hora para acabar. E devemos, de forma compromissada, aprender o que Marielle Franco nos ensinou: o racismo, o patriarcado e o capitalismo andam de braços dados, e a luta política por um outro projeto de sociedade só será efetiva se combatermos todas estas estruturas.
Marielle Vive!

Conheça a história das mulheres defensoras, assassinadas nos últimos dois anos por defender direitos humanos no Brasil.

Edilene Mateus Porto. Trabalhadora rural. Acampamento 10 de maio, Alto Paraíso – Rondônia. 2016

Edilene tinha 32 anos e foi assassinada a tiros junto com seu companheiro Isaque Dias, perto do acampamento 10 de Maio, local em que moravam e lutavam pelo direito à terra. Ambos, denunciavam aos órgãos públicos as arbitrariedades cometidas no local. Nesse contexto, tanto Isaque quanto Edilene estavam ameaçados de morte.

Adna Senhora Teixeira – liderança, trabalhadora rural. Cujubim – Rondônia. 2016
Assassinada com 21 facadas, por três homens, quando estava com o marido na Linha CA 04, Km 28, ocupação do Sítio Baianinho, em Cujubim, área de conflitos por terra. O cônjuge dela, identificado apenas como L. R também foi atacado e ferido, porém sobreviveu. Ambos lutavam pelo direito à terra. Um dos suspeitos pelo homicídio foi preso pela Polícia Civil de Cujubim, no dia 12/08/2016.

Nilce de Souza Magalhães (Nicinha), liderança do MAB. Monte Negro – Rondônia. 2016

Liderança do Movimento dos Atingidos por Barragens. Denunciava as violações de direitos humanos cometidas pelo consórcio responsável pelas hidrelétricas do rio Madeira. Desapareceu no dia 07/01/2016, no acampamento em que morava com outras famílias, nas imediações do referido rio. Suspeita-se que a pessoa que a matou recebeu ajuda para o homicídio e a ocultação do cadáver. O corpo de Nicinha foi encontrado no dia 21/06/2016, no lago da UHE de Jirau, amarrado a uma pedra, com as mãos e os pés atados.

Cleidiane Alves Teodoro, trabalhadora rural. Monte Negro – Rondônia. 2016

Os corpos Cleidiane Alves Teodoro e seu companheiro, Luís Carlos da Silva, foram encontrados boiando, no rio Candeias, na região do Vale do Jamari, mais especificamente na Linha C-26, em Buritis. Os movimentos sociais locais informam que ambos eram lideranças do movimento de luta pela terra e a motivação do crime tem a ver com os conflitos agrários.

Francisca das Chagas Silva, liderança Sindicalista e Quilombola. Amarante do Maranhão – Maranhão. 2016

Quilombola da comunidade Joaquim Maria e dirigente do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Miranda do Norte, município em que morava. Encontrada morta em uma poça de lama. O corpo estava nu, aparentava sinais de estupro, estrangulamento e perfurações. Entidades e movimentos sociais do campo denunciam que o homicídio de Francisca resulta de sua luta por uma vida mais digna para milhares de trabalhadoras/es do campo e das florestas.

Giovana Deodoro, indígena Kaigang. Mato Castelhano – Rio Grande do Sul. 2016
Assassinada a tiros. Lutava pela demarcação do território do povo Kaingang. O processo se arrasta há mais de 12 anos. Além do homicídio outros quatro indígenas ficaram feridos.

Jane Julia de Oliveira. Liderança sem terra. Pau D´Arco- Pará – 2016

Liderança, foi uma das trabalhadoras rurais assassinada pelas Polícias Militar e Civil do estado do Pará no Massacre de Pau D´Arco. Após atuação dos movimentos sociais, ficou demonstrada que o que aconteceu foi uma execução, patrocinada por agentes de estado. A investigações seguem e tem por um dos objetivos chegar aos mandantes do crime.

Kátia Martins de Souza. Liderança sem terra. Castanhal – Pará. 2017

Presidente da Associação de Moradores do Acampamento 1º de janeiro, assassinada com cinco tiros em sua casa, por dois homens encapuzados, que chegaram de moto. O crime ocorreu por volta das vinte horas e a vítima estava na companhia do neto de apenas seis anos, que morava com ela. Martins era liderança atuante no acampamento e antes de ser morta participou de uma reunião destinada a arrecadar verbas para projetos no acampamento. Ela declarou, dias antes, que se sentia ameaçada e achava que estava marcada para morrer.
Maria Trindade da Silva Costa. Liderança quilombola. Moju – Pará. 2017

Corpo da líder quilombola Maria Trindade da Silva Costa foi encontrado pela família no dia 24 de junho de 2017. Segundo a comunidade ela era liderança na região e conhecida por sua atuação à frente da comunidade Santana do Baixo Jambuaçu onde vivia. Era também representante da Comunidade Eclesiástica de Base (CEB) na localidade.

Maria da Lurdes Fernandes Silva. Itupiranga- Pará. 2017

Maria da Lurdes Fernandes Silva e seu companheiro, Manoel Índio, foram
assassinados na dentro do do projeto de assentamento UXI. Durante a noite, os vizinhos
do casal ouviram inúmeros disparos de armas de fogo na residência das vítimas. Pela manhã, o corpo de Maria de Lurdes foi encontrado na área de entrada da casa, atingido por vários tiros. O casal lutava pelo direito à terra e Manoel havia comparecido or inúmeras vezes, no INCRA, na Delegacia de Conflitos Agrários, na Polícia Federal, no Ministério Público Federal, etc, para denunciar a aquisição ilegal de parcelas nas proximidades do seu lote, alteração de limites de sua parcela e ameaças.
Sônia Vicente Cacau Gavião, “Cry Capric”. Indígena. Amarante do Maranhão – Maranhão. 2017

Sônia Vicente Cacau Gavião (Cry Capric) morreu em decorrência de atropelamento causado por um caminhão madeireiro, na cidade de Amarante do Maranhão, perto da Terra Indígena Governador, atentado que também vitmou seu companheiro, José Caneta Gavião. Os indígenas atribuem as mortes em represálias à atuação do povo Gavião contra práticas ilegais de extração de madeira dentro de seu território. Caso ainda em investigação.



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Ações: Defensores e Defensoras de Direitos Humanos

Eixos: Política e cultura dos direitos humanos