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AMANHÃ | Ruralista vai a júri popular pela morte de trabalhador sem terra no Paraná


Pela segunda vez no banco dos réus, o ruralista e ex-presidente da União Democrática Ruralista (UDR), Marcos Prochet, vai a júri popular em Curitiba pelo assassinato do trabalhador rural Sebastião Camargo nesta quinta-feira (25).
 


 

>>Caso Sebastião Camargo

Acusado pelo assassinato do trabalhador rural sem terra Sebastião Camargo, o ruralista Marcos Prochet irá a júri popular nesta quinta-feira (25), no Tribunal do Júri de Curitiba, a partir das 9h. Essa será a segunda vez que o crime será analisado – o primeiro julgamento, realizado em 2013, foi anulado pelo Tribunal de Justiça do Paraná no fim de 2014. Na ocasião, o ruralista foi condenado a 15 anos e 9 meses de reclusão em regime inicialmente fechado por ter sido considerado autor do disparo que vitimou o trabalhador. 

Sebastião CamargoO assassinato de Sebastião Camargo ocorreu em 1998, durante um despejo ilegal de um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, na Fazenda Boa Sorte, em Marilena, Noroeste do Paraná. A ação violenta envolveu cerca de 30 pistoleiros encapuzados e, além da morte de Camargo, outras 17 pessoas ficaram feridas, inclusive crianças. A fazenda onde ocorreu o despejo já havia sido declarada como de interesse social pelo Governo Federal no ano anterior, por meio do Decreto 7 de novembro de 1997, e estava em processo de desapropriação.

Ex-presidente da União Democrática Ruralista – associação de proprietários rurais voltada à “defesa do direito de propriedade” que é contrária à Reforma Agrária – Marcos Prochet participou da ação e atirou no trabalhador sem terra, irritado com o fato de Camargo não ter baixado a cabeça quando mandado. Pela idade e com dores na coluna, a vítima não conseguia permanecer com a cabeça encostada no chão.

Sebastião Camargo morreu aos 65 anos, e deixou cinco filhos – alguns deles menores de 18 anos.
 

Demora e impunidade no Sistema de Justiça

A morosidade na conclusão das investigações e na condenação dos culpados marca a trajetória do caso. O ex-presidente da UDR teve seu julgamento adiado duas vezes, e o júri que o condenou a mais de 15 anos de prisão, em 2013, foi anulado no fim de 2014.

Prochet é a quarta pessoa a ir a júri popular pela morte de Sebastião Camargo. Outras duas pessoas também já foram condenadas pela participação no crime: Teissin Tina, ex-proprietário da fazenda Boa Sorte, onde o agricultor foi morto, recebeu condenação de seis anos de prisão por homicídio simples; Osnir Sanches foi condenado a 13 anos de prisão por homicídio qualificado e constituição de empresa de segurança privada, utilizada para recrutar jagunços e executar despejos ilegais.

Augusto Barbosa da Costa, integrante da milícia privada, também foi condenado, mas recorreu da decisão. Denunciado apenas em 2013, o ruralista Tarcísio Barbosa de Souza, presidente da Comissão Fundiária da Federação de Agricultura do Estado do Paraná – FAEP, ligada à Confederação Nacional da Agricultura (CNA), também responde pelo crime.

Enquanto isso, a família de Sebastião Camargo espera justiça. Filhos, noras e netos do trabalhador aguardam há 18 a condenação do ruralista e demais acusados. Neste período, a morte do trabalhador não foi um caso isolado. Entre 1995 e 2002, ao menos outros 16 trabalhadores rurais sem terra foram assassinados.

A ação organizada de ruralistas, a omissão da Justiça em casos como este, e o consentimento de agentes ligados ao governo estadual da época e à polícia militar são fatores em comum nos assassinatos. Além das condenações pelo assassinato de Sebastião Camargo, em apenas em um destes casos – na morte do trabalhador Eduardo Anghinoni - houve condenação do executor.

As violações ocorridas do direito à vida, às garantias judiciais e à proteção judicial que marcaram o assassinato do trabalhador sem terra levaram a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) a responsabilizar o Estado Brasileiro pelo crime, em 2009, 11 anos após o assassinato.

Em seu relatório, a CIDH afirmou que “o Estado brasileiro não cumpriu sua obrigação de garantir o direito à vida de Sebastião Camargo Filho (…) ao não prevenir a morte da vítima (…) e ao deixar de investigar devidamente os fatos e sancionar os responsáveis”.
 

Entenda melhor a cronologia dos casos

7 de novembro de 1997
Fazendas Santo Ângelo e Boa Sorte localizadas em Marilena, Noroeste do Paraná, são declaradas de interesse social pelo governo Federal. As áreas descumpriam sua função social, por isso deveriam ser desapropriadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e destinadas à reforma agrária.

19 de novembro de 1997
Cerca de 70 famílias ocupam a Fazenda Boa Sorte para cobrar agilidade no processo de desapropriação da área.

7 de fevereiro de 1998
Mais de 40 homens armados com escopetas calibre 12, encapuzados e vestidos com camisas pretas invadem a Fazenda Boa Sorte determinados a despejar ilegalmente as 70 famílias sem terra que ocupavam o local. Durante a ação, os pistoleiros fazem os acampados e acampadas – incluindo crianças e idosos- deitar chão, com as mãos na cabeça. Sebastião, na época com 65 anos e sofrendo de problemas de coluna, tem dificuldade para se manter nessa posição e tenta apoiar cabeça sob as mãos. É morto com um tiro na cabeça. 

30 de junho de 2000
Movimentos e organizações denunciam Estado Brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) por violações de direitos humanos e demora nas investigações do assassinato de Sebastião Camargo. 

5 de maio de 2000
Mais de 2 anos depois, o inquérito policial é concluído. Devido à demora, alguns crimes prescrevem. 

2 de março de 2001
Devido à existência de fortes indícios de que Prochet seria o responsável pela execução de Sebastião Camargo, o ruralista é denunciado pelo Ministério Público. 

19 de março de 2009
A CIDH emite Relatório 25/2009, responsabilizando o Estado Brasileiro por violação ao direito à vida, garantias judiciais e proteção judicial no caso. 

27 de novembro de 2012
Um dia antes de ir à júri popular, o ruralista troca de advogado e pede para que o seu julgamento seja adiado.

4 de fevereiro de 2013
Prochet deveria ir a júri popular, porém o ruralista consegue, mais uma vez, adiar o julgamento.

22 de novembro de 2013
Prochet vai a júri e é condenado a 15 anos e 9 meses de prisão pelo assassinato do trabalhador sem terra Sebastião Camargo.

19 de dezembro de 2014
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná anula júri que condenou o ruralista, Marcos Prochet, por falhas na intimação das testemunhas e uso de objeto não juntado aos autos durante sustentação oral do assistente da acusação. 

Serviço

Júri Popular de Marcos Prochet
Data: 25 de agosto de 2016
Horário: 9h
Local: Tribunal do Júri
Rua Ernâni Santiago de Oliveira, 268 - Centro Cívico
Curitiba/PR



Ações: Conflitos Fundiários, Defensores e Defensoras de Direitos Humanos
Casos Emblemáticos: Sebastião Camargo Filho
Eixos: Política e cultura dos direitos humanos