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Omissão, medo e falta de reparação são entraves nas denúncias de contaminação por agrotóxicos


É o que mostra documento intitulado “Agrotóxicos e Violação dos Direitos Humanos no Brasil”, lançado no dia 21 de setembro pela articulação Campanha Contra os Agrotóxicos e pela organização Terra de Direitos. 

A omissão de órgãos fiscalizadores, o medo das pessoas em denunciar e a falta de reparação às vítimas são alguns dos principais entraves para que os culpados por crimes ambientais causados por agrotóxicos sejam responsabilizados. É o que mostra o dossiê “Agrotóxicos e Violação dos Direitos Humanos no Brasil”, lançado no dia 21 de setembro pela Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida e pela organização Terra de Direitos. 

O dossiê analisou um total de 30 casos emblemáticos de violação de direitos humanos decorrentes do uso de agrotóxicos ocorridos de 2003 a 2022 em todos os estados brasileiros. Destes, apenas 13 tiveram alguma judicialização, sendo que em um deles houve responsabilização reversa, ou seja, criminalização dos denunciantes e manifestantes. As omissões ou morosidade na atuação dos órgãos de fiscalização, especialmente no atendimento imediato da população atingida e na produção de provas, foram apontadas como elementos dificultadores na hora de se judicializar os crimes.  

Além disso, o medo é também um desencorajador na realização de denúncias. Em 4 dos casos, as vítimas tiveram medo de denunciar, especialmente em situações de conflitos territoriais e socioambientais latentes, nas quais o agrotóxico é também utilizado como arma química de expulsão ou amedrontamento. E em 3 casos (ou 10% da amostra total) houve ameaça explícita aos denunciantes. Identificou-se também que nos casos em que as vítimas não querem se identificar, os desdobramentos judiciais e midiáticos são menos significativos. 

Mesmo nos casos em que há judicialização e em que as vítimas realizam denúncias, o resultado não se mostra positivo. Isso porque as vítimas não foram integralmente reparadas em nenhuma das ocorrências analisadas. Apenas em 3 casos - ou 10% do total -, houve reparação parcial. Já nos outros 27, as comunidades e grupos atingidos pelos agrotóxicos não receberam reparação alguma. 

O trabalho de pesquisa durou cerca de um ano e sua realização contou com o apoio da Fundação Heinrich Böll. 

Áreas residenciais foram as mais atingidas 
As principais áreas contaminadas pelo uso indiscriminado de agrotóxicos foram residências ou moradias (14 dos casos), o que demonstra alto grau de exposição de famílias inteiras, incluindo crianças e bebês. A maior parte das comunidades violadas nos casos analisados pertencia a camponeses e agricultores familiares (12 casos), seguidos de povos indígenas (3), comunidades quilombolas (3), trabalhadores rurais (3), escolas rurais (2), populações urbanas (2), além de ocorrências de mortandade de abelhas (2). 

Dos 30 casos, 76% apresentaram intoxicação de pessoas, com registros de três óbitos, sendo pelo menos um deles por intoxicação crônica (aquela ocasionada pela exposição prolongada e contínua aos agrotóxicos). Os principais sintomas relatados pelas vítimas foram problemas respiratórios, coceiras na pele e dor de cabeça e mal estar. Além disso, a intoxicação por agrotóxicos também pode resultar em depressão, malformação de fetos e câncer. 

Depois de áreas residenciais, em segundo lugar de áreas mais atingidas estão as plantações orgânicas ou agroecológicas (10), seguidas por contaminação de mananciais (7) e florestas (3). O documento verificou também a contaminação em equipamentos públicos, como escolas e hospitais, em quatro das ocorrências analisadas.  

Maioria sai impune 
Em 97% dos casos, o crime ocorreu por ação de agente privado externo à comunidade ou por ações de empresas privadas. Em apenas 11 dos 30 casos houve alguma responsabilização do agente violador. 

“A pesquisa mostra que o país apresenta dificuldades na fiscalização, no atendimento da população atingida, na apuração dos fatos, na responsabilização dos agentes causadores dos danos e na reparação dos danos socioambientais constatados, além da baixa capacidade dos laboratórios conveniados de identificar os agrotóxicos utilizados nessas ocorrências. Todo esse cenário é agravado pela atribuição da produção de provas e demonstração dos danos às próprias vítimas, que são na maioria das vezes comunidades vulneráveis”, disse a advogada Naiara Bittencourt, da Terra de Direitos, que coordenou a pesquisa. “Além de trazer essas denúncias à tona, elencamos no documento algumas sugestões para a mitigação destes problemas”. 

Entre as sugestões apontadas pelo dossiê estão, por exemplo, o aperfeiçoamento de legislações referentes ao uso de agrotóxicos, como a aprovação da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos, a elaboração de protocolos unificados de ação entre órgãos fiscalizadores e a criação de um canal unificado de denúncias para a população. 

Como denunciar 
Para ajudar a superar a falta de informações dos órgãos para a realização de denúncias, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos lançou dentro de seu site uma sessão orientativa. Na nova página, encontra-se um passo-a-passo para a construção de uma denúncia, além de modelos de ofícios e contatos dos órgãos estaduais e federais onde as denúncias podem ser encaminhadas. Além disso, o site reúne tratados internacionais e uma série de legislações e normativas nacionais, estaduais e municipais que podem ajudar a embasar a denúncia. 



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