Justiça nega pedido para arquivar caso do confronto PM x MST em Quedas


O complexo processo judicial envolvendo o confronto entre a PM (Polícia Militar) e integrantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) - que ocorreu no acampamento Dom Thomás Balduino em Quedas do Iguaçu em abril de 2016 - teve um importante desdobramento.

Neste mês, a Justiça negou um pedido feito pelo MP (Ministério Público) para arquivar o processo que investiga as duas mortes que ocorreram durante o tiroteio. A juíza Fernanda Orsomarzo também decidiu remeter o caso para o Procurador Geral de Justiça do Paraná, Ivonei Sfoggia.

"Indefiro o pedido de arquivamento formulado pelo Ministério Público e, via de consequência, determino a remessa do presente procedimento investigatório ao Excelentíssimo Procurador Geral de Justiça do Estado do Paraná".

No tiroteio de 7 de abril de 2016, foram mortos os integrantes do MST, Vilmar Bordim e Leonir Orback. Outros dois militantes ficaram feridos: Pedro Francelino e Henrique Gustavo Souza Pratti, que foram presos mas depois liberados.

A Promotoria entendeu que os policiais agiram em legítima defesa ao efetuarem os disparos. No entanto, a juíza Fernanda Orsomarzo, teve outro entendimento.

"O ato de arquivar o presente procedimento envolve imensurável responsabilidade por parte desta magistrada, sobretudo porque, repita-se, diz respeito à morte de duas pessoas. Dar cabo sumariamente à discussão demanda prova inequívoca de que os policiais, usando moderadamente dos meios necessários, repeliram injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem". 

Para a magistrada, há diversas contradições nos depoimentos e fatos que precisam ser esclarecidos, como quem atirou primeiro, o que provocou a reação da polícia e dos seguranças da empresa Araupel e também quem provocou incêndios que foram registrados no acampamento. 

"Não se sabe ao certo o que desencadeou a ação policial, tampouco os motivos pelos quais seis policiais, na companhia de vigilantes armados da empresa Araupel (um deles ocupando a viatura), deslocaram-se ao local. Também não se sabe ao certo se o incêndio estava ocorrendo no dia dos fatos ou se já havia ocorrido no dia anterior. Não se sabe quem apoiou quem ou de quem partiu a ordem de ação: enquanto os policiais militares afirmam que foram acionados para prestar apoio aos policiais ambientais, estes últimos dizem que teriam recebido ordem para acompanhar aos funcionários da empresa Araupel", concluiu Fernanda Orsomarzo.

Embora os policiais tenham afirmado que agiram em legítima defesa e o MP tenha este mesmo entendimento, a juíza escreveu que isso não ficou cabalmente provado.

"Acontece que os depoimentos que afirmaram que o primeiro disparo partiu do grupo de integrantes do MST são, em sua totalidade, de policiais militares diretamente envolvidos no confronto e, portanto, interessados no deslinde do feito. Não há como a eles conceder valor probante absoluto, a ponto de fundamentar o arquivamento com base na legítima defesa."

A mesma exigência de prova cabal ela remete à afirmação de que o MST efetuou o primeiro disparo. Em determinado de trecho, ela levanta, inclusive, a possibilidade de que MST não tenha atirado nenhuma vez porque não foram encontradas munições e porque nenhuma das viaturas da PM foram atingidas nem mesmo de raspão.

"O fato de não terem sido localizadas quaisquer munições deflagradas que comprovem cabalmente que ao menos um tiro foi disparado no dia dos fatos pelos integrantes do MST (as viaturas policiais não foram atingidas sequer de raspão) revela a necessidade de instrução dos autos perante este Juízo".

A juíza também enumera que os agentes policiais atiraram 153 vezes.

"Exige-se a certeza. Em um cenário no qual foram disparados, comprovadamente, 153 tiros pelos agentes policiais, sem prova cabal de que um tiro sequer tenha sido feito pelos integrantes do MST, não há como encerrar a discussão com base em presunções ou, ainda, com fundamento na palavra dos próprios policiais diretamente envolvidos no episódio".

Outro trecho que chama a atenção na decisão, é que teria havido excesso de legítima defesa dos policiais e que isso deve ser considerado pelo Judiciário.

"Ainda que restasse demonstrado que o primeiro tiro partiu dos integrantes do MST, eventual excesso na legítima defesa dos policiais militares deveria ser levado ao exame do Poder Judiciário".

Na mesma decisão, a juíza determinou a suspensão da denúncia de crime de resistência qualificada contra os agricultores ligados ao MST, Rudmar Moeses, Claudir Braga, Antonio de Miranda e Valdemir Xalico de Camargo.



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