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Mudar a cultura da prestação jurisdicional é imprescindível para um Judiciário mais democrático e acessível


Um dos maiores desafios do CNJ continua sendo a legitimação política junto ao próprio Poder Judiciário para exercer sua direção administrativa e seu planejamento estratégico. Essa resistência se manifesta ainda hoje na pouca atenção que o TJ-SP, por exemplo, tem dado às solicitações do CNJ, mas existe desde sua criação, com a ADIN proposta pela AMB.

O corporativismo da magistratura, a pretensão de isolamento do judiciário perante a sociedade e aos demais poderes da república são obstáculos a serem superados pelo e no CNJ. A superação da visão civilista, procedimentalista, patrimonialista e individualista de parte dos magistrados e funcionários da justiça também são imprescindíveis para que o Poder Judiciário possa ser mais democrático e acessível. É indispensável a superação dessas premissas para que o judiciário seja efetivamente acessível à população, hoje marginalizada, e contribuir para a consecução dos fundamentos constitucionais do estado brasileiro, principalmente na redução das desigualdades sociais.

O Judiciário muito carecia de um órgão que pudesse estipular estratégias político organizacionais em nível nacional e fiscalizar a atuação administrativa de magistrados, funcionários do poder e a atuação dos cartórios. A criação da Corregedoria Nacional no CNJ, por exemplo, é um importante instrumento para que efetivamente se realize a fiscalização da conduta de magistrados que faltam com seus deveres funcionais. Esse espaço também pode se consolidar como alternativa a magistrados de primeiro grau que sofrem pressões políticas de seus tribunais, assim como viabiliza a fiscalização de atuação dos desembargados que, pela composição das corregedorias dos tribunais, se autofiscalizavam.

A efetividade democratizante dessas ações, contudo, dependem da afirmação da posição política do CNJ no judiciário, mas, sobretudo, das disputas políticas que conduzirão a atuação do conselho. Com esse pressuposto o controle social efetivo tem importante papel.

O fato do Conselho possuir em sua composição magistrados, representantes da sociedade, OAB e do Ministério Público já é uma tímida, mas simbolicamente importante, abertura democratizante na estrutura do Poder Judiciário. Na última composição do CNJ, a sociedade não debateu a escolha de seu representante pelo Senado, sendo o escolhido fruto de articulação política do próprio presidente do CNJ e do STF, Ministro Gilmar Mendes, que atua concentrando poder na cúpula do judiciário.

A intervenção de não magistrados, com destaque para representantes da sociedade, na condução dos rumos políticos e estratégicos, assim como na fiscalização, poderia contribuir muito com a necessária mudança que deve passar o Poder Judiciário. Mas se as intervenções do CNJ forem pautadas apenas na visão da cúpula do poder, sem que existam instrumentos democráticos de intervenção da sociedade e dos demais juízes que o compõe, pouco se pode esperar na atuação pela efetivação de direitos humanos no sistema de justiça, para citar apenas um exemplo.

O Planejamento estratégico do CNJ e a mudança na prestação jurisdicional

As ações de mutirão realizadas pelo CNJ para desafogar Tribunais e Juízos de primeiro grau julgando processos, averiguar a possibilidade de soltar presos com direito à liberdade são ações importantes para solucionar uma demanda pontual. Contudo, essas ações devem vir acompanhadas de uma reflexão sobre a realidade encontrada, principalmente quanto às causas desses problemas e as possibilidades de intervenção visando a superação dos mesmos, sob pena da hercúlea ação se transformar em ativismo sem pretensão de mudar a estrutura arcaica do judiciário.

As dez metas nacionais de nivelamento estipuladas pelo CNJ para o ano de 2009 tratam das questões relacionadas de logística, mas relegam intervenções mais contundentes nos costumes judiciais que tornaram o Poder Judiciário lento e inacessível à população. Nesse sentido, a ambiciosa “meta 2″ do CNJ, de julgar ainda este ano todos os processos distribuídos no sistema brasileiro até 2005, não resolve os crônicos problemas que geraram o acúmulo de processos.

A atuação do conselho no planejamento estratégico do judiciário deve estar pautada na necessidade de mudança cultural na prestação jurisdicional. Para uma maior efetividade da intervenção do CNJ é necessária uma atuação pautada não pelo casuísmo,nem pela resolução de questões pontuais e imediatas. As principais ações devem intervir na cultura de prestação jurisdicional, voltando-se para as necessidades da sociedade, não apenas para as dos operadores do direito.

Qualidade do Judiciário e a necessária participação social

A reflexão e atuação na necessária democratização do Poder Judiciário e no incremento ao acesso à justiça vão além da disponibilidade de advogados que atuem gratuitamente, horários de funcionamento e plantão em fóruns e tribunais, disponibilização de dados sobre a justiça e resolução de processos pendentes. Serão necessários esforços para pensar e viabilizar formas alternativas de resolução de conflitos, priorizando as modalidades não jurisdicionais, priorização de litígios de alta intensidade, formas de resolução conjunta de litígios repetitivos, priorizando modalidades coletivas acesso à justiça.

Nesses temas o judiciário deve repensar, inclusiva, a atuação do próprio Estado (nas três esferas de organização) ante o sistema de justiça, uma vez que ele é o maior responsável por litígios repetitivos, de baixa litigiosidade e, muitas vezes, economicamente inviáveis para o próprio poder público.

O Judiciário exerce seus poderes em nome do povo e através do CNJ, pode abrir franco espaço de articulação e diálogo para que os cidadãos (não só advogados) possam discutir, interagir e opinar sobre as políticas judiciárias. O judiciário deve mudar para que possa, como um dos poderes de Estado, contribuir na redução das desigualdades sociais e na efetivação dos direitos humanos. O CNJ pode ser um importante canal de diálogo de magistrados de primeiro grau, de defensores públicos, de funcionários do judiciário e, principalmente, da sociedade. Sujeitos estes historicamente preteridos na conformação das políticas judiciárias. Mas se ressalta: é indispensável a criação de um articulado espaço político pela sociedade, que seja autônomo e independente, par poder levar à cúpula do judiciário a voz das ruas.



Ações: Democratização da Justiça
Eixos: Democratização da justica e garantia dos direitos humanos