Comunidades ribeirinhas de Pimental e São Francisco entregam protocolo de consulta ao MPF
Maria Mello
Representantes dos povos ribeirinhos de Pimental e São Francisco, no município de Trairão (PA), entregaram na manhã desta segunda-feira (13) o Protocolo de Consulta das comunidades ao Procurador do Ministério Público Federal (MPF) em Santarém, Paulo de Tarso Oliveira.
Junto a integrantes da Terra de Direitos, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e da Comissão Pastoral da Terra (CPT), os moradores da beira do rio Tapajós apresentaram ao Procurador o documento – que reafirma o direito à consulta prévia, livre e informada a estas comunidades, existentes há mais de cem anos. “Queremos ser ouvidos e respeitados. Exigimos que nossos direitos sejam cumpridos diante de qualquer grande projeto que venha trazer impactos ao nosso território”. O Protocolo aponta, ainda, em que lugares, de que maneira e com quais segmentos a consulta deve ser realizada. As comunidades também exigem o respeito à Convenção 169 também para as comunidades vizinhas do povo Munduruku, às comunidades tradicionais próximas e ao povo Apiaká – que compartilha o mesmo território das comunidades.
Segundo os ribeirinhos, as comunidades de Pimental e São Francisco, que abrigam atualmente cerca de 320 famílias, seriam inicialmente impactadas pela hidrelétrica São Luiz do Tapajós (cujo projeto foi arquivado em agosto de 2016 por uma decisão do Ibama), mas logo foram surpreendidas pela construção de portos em Miritituba (distrito vizinho) e nas próprias áreas das comunidades.
Gelsiane Nascimento, do MAB, considera o protocolo um avanço para a luta. “Sabemos que ele não nos dá completa segurança, mas é garantia de alguma coisa, uma arma. Como se não bastasse, os empreendimentos agora também estão avançando pela estrada. Não é só a hidrelétrica, tem outros empreendimentos que assustam a comunidade. Temos consciência de que não é desenvolvimento para o povo. Não queremos empreendimentos, mas queremos melhorias para nosso povo”, defende.
Para Risonildo dos Santos, pescador da comunidade, o documento tem o papel de comprovar que as comunidades existem e serão afetadas por grandes empreendimentos. “Fomos negados pelo governo como terra tradicional. Criamos esse protocolo para mostrar que esse trabalho foi feito pelos moradores, e não pelo governo que coloca um satélite e diz que não há povos tradicionais na região. Os empreendedores fizeram uma reunião discutir os portos dizendo que não iam prejudicar os rios, mas hoje existem muitas barcaças quem não permitem nossa convivência”, relata. “Vivíamos como se não tivesse ninguém lá. Diziam que não tinha ninguém mas isso prova que tem gente”, concorda Luiza Damiana de Oliveira, moradora de São Francisco.
Ao receber o documento, o procurador Paulo de Tarso ressaltou o processo de negação histórica de direitos na Amazônia. “Na Amazônia isso fica mais facilitado por uma crença de que aqui não há pessoas. Uma omissão que leva a um cenário de invisibilidade, e em última análise à supressão de direitos. O protocolo é um passo muito importante que diz, a quem quer que venha a manifestar interesse pela região, que há pessoas nesses lugares, mostrar que a Amazônia não pode continuar sendo tratada como território desabitado. Fico muito satisfeito e felicito vocês por essa iniciativa”.
Raione Lima, da CPT, destacou a rapidez com que os portos foram construídos na região. “Enquanto discutíamos a Hidrelétrica do Tapajós, um porto foi construído. É algo assustador, que configura grandes violações de direitos humanos. Temos atuado no sentido de motivar as comunidades a continuarem resistindo”, explica.
Assessor jurídico da Terra de Direitos, Pedro Martins informou que denúncias já foram protocoladas pela entidade e lembrou dos empreendimentos em curso. “Porto é apenas a ponta, e no território o impacto é imenso: carretas trazem soja, acidentes, barulho etc. Estamos aguardando decisão sobre os pedidos judiciais da Terra de Direitos no caso, a área de impacto deve ser percebida como maior, mais alargada, incluindo as terras indígenas ao redor, e o território pluriétnico de Pimental, já que devem ser considerados os efeitos sinérgicos dos empreendimentos portuários, hidrelétricos (PCHs) e ferroviários sobre a bacia do Tapajós. Apesar de tudo, este é um momento de comemoração, estamos muito felizes”.
Confira na íntegra o Protocolo de consulta das comunidades ribeirinhas Pimental e São Francisco
Ações: Conflitos Fundiários, Empresas e Violações dos Direitos Humanos, Impactos de Megaprojetos
Eixos: Terra, território e justiça espacial