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Depois de audiência pública, MP do Pará deve investigar Cargill


CargillA Terra de Direitos participou, na quarta-feira (14), de audiência pública em Santarém – PA que reuniu cerca de 1600 pessoas, entre representantes de organizações públicas, movimentos populares e organizações não-governamentais, além de ambientalistas e fazendeiros. Os objetivos principais foram discutir as mudanças causadas pela instalação da Cargill na região e debater se o Estudo de Impactos Ambientais e o Relatório de Impactos Ambientais (EIA-RIMA) apresentados pela empresa abrangem ou não todos os impactos dessa instalação. O documento foi feito somente depois de ter de a empresa ter sido condenada pelo TRF 1ª Região, ou seja, a Cargill se instalou na cidade sem ter feito EIA-RIMA.

Dez anos depois da chegada da empresa à região, a discussão sobre o tema expôs indícios de que informações contidas nos estudos não são verdadeiras. A construção do terminal de grãos levou ao município de Santarém e região, em 2003, a expectativa de emprego e desenvolvimento. Mas, de acordo com a discussão feita durante a audiência, o aumento no cultivo de soja pela criação do escoadouro do produto na região fez com que a grilagem de terras aumentasse. Com isso, cresceu também o número de ameaças de morte e o aumento no fluxo de trabalhadores que deixam o campo para morar nas cidades.

O procurador do Ministério Público do Pará, Felício Pontes, disse que a população esperava uma grande mudança em Santarém com a chegada da empresa, mas, na opinião dele, o que houve foi exatamente a intensificação dos problemas apontados em grande parte das falas da audiência. “O porto da Cargill só gera 142 empregos em Santarém. Se o porto tivesse beneficiado diretamente todas as pessoas que estão dentro deste salão, ele já seria um fracasso para essa cidade, mas nem isso ele fez", diagnosticou.

No mesmo dia em que foi realizada a audiência, o Ministério Público do Pará (MP-PA) informou ao Ministério Público Federal (MPF) que abrirá inquérito policial para investigar a veracidade dos dados do EIA-RIMA apresentado pela Cargill. A investigação deve apurar as responsabilidades da multinacional e da empresa que realizou os estudos.

Modelos de agricultura em debate

De acordo com o assessor jurídico da Terra de Direitos, João Carlos Camerini, camponeses e grandes produtores representam a disputa entre dois modelos de agricultura em um mesmo espaço. “As principais ofensas aos direitos humanos com a instalação do porto e a atração de sojeiros foram as ameaças e a violência contra os camponeses, o direito à terra e à moradia, pois a pressão e a especulação fundiária provocam o êxodo rural e ida para as periferias da cidade. Além disso, o direito ao meio ambiente também é afetado por causa do aumento do desmatamento, e o direito ao trabalho e à cultura camponesa é afetado, pois a agricultura familiar vai sendo substituída pela monocultura da soja”.

A Terra de Direitos apresentou, em ofício, sugestão à Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará (SEMA/PA) para mediar o caso. “Depois de supridas todas as lacunas apontadas no EIA-RIMA e evidenciados os reais impactos do empreendimento da transnacional, se a SEMA/PA concluir pela viabilidade do porto da Cargill, [que] seja assinado um Termo de Ajustamento de Conduta”, sugere a organização. Neste acordo, participariam órgãos ambientais federais, estaduais e municipais, Ministério Público Federal e Estadual e demais interessados do Poder Público e da sociedade civil, especificando restrições à empresa se for constatada a compra de soja de propriedades que não cumprem sua função social.

Articulação local

Desde a primeira ação civil pública do MPF, em 2000, a sociedade civil foi quem denunciou e encaminhou documentos e estudos indicando falhas e argumentos opostos aos defendidos no EIA-RIMA. Carolina Alves, assessora jurídica da Terra de Direitos, destacou a importância que a população local teve para realizar pela primeira vez um debate que leva em consideração a voz dos principais atingidos pelos impactos da instalação da empresa na região. “Os ‘sojeiros’ têm muito poder, e sem o MP e a sociedade civil, nem essa audiência teria sido realizada. Lembremos que ela só ocorreu depois de 10 anos do início da instalação do Porto da Cargill, imagine se não tivesse pressão”, questiona.



Ações: Empresas e Violações dos Direitos Humanos

Eixos: Terra, território e justiça espacial