Direto de Bonn: comunidades tradicionais reivindicam participação permanente na governança climática global
Assessoria de comunicação Terra de Direitos
Em documento, povos e comunidades alertam que ainda não compõem estrutura formal da Convenção da ONU para Mudanças Climáticas.
Redes e organizações representativas de comunidades tradicionais da América Latina reivindicam que povos e comunidades tradicionais de todo o mundo possam ser representados, em maior diversidade, na Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas (LCIPP) e nos canais formais de participação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC).
Em carta dirigida ao Secretariado da UNFCCC e aos membros do Grupo de Trabalho Facilitador da Plataforma, na última sexta-feira (13), em Bonn (Alemanha), os signatários do documento destacam que é urgente que os órgãos de governança climática mundial não apenas reconheçam o papel que estes sujeitos desempenham no enfrentamento da crise climática, mas também garantam condições de participação efetiva e assentos permanentes nos espaços de governança da política climática.
Para o grupo, é essencial que “comunidades locais deixem de ser invisibilizadas e passem a ser reconhecidas como atores essenciais na resposta global à crise climática”. No Brasil, redes e organizações compreendem as comunidades locais (termo estabelecido pelo Acordo de Paris) como comunidades tradicionais. Presente em Bonn, a Terra de Direitos assina também a carta.
Acesse a carta. (Documento em português, espanhol e inglês).
Os signatários do documento destacam que participação efetiva de povos tradicionais na tomada de decisões que afetem seus modos de vida – como a política climática - são assegurados em normativas como o Acordo de Paris e Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), entre outros. No entanto, apontam os signatários, a participação na Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas é ainda restrita a apenas a povos indígenas com assento no grupo facilitador da Plataforma, o que não contempla a diversidade de povos e comunidades tradicionais.
“A ausência de reconhecimento formal das comunidades locais no âmbito da UNFCCC representa uma lacuna significativa na governança climática global. Apesar de exercerem papéis fundamentais na conservação da biodiversidade, na proteção dos ecossistemas e no fortalecimento da resiliência climática, as comunidades locais seguem excluídas dos espaços institucionais de tomada de decisão, como o Grupo de Trabalho Facilitador da Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas (LCIPP)”, aponta a nota técnica que acompanha o documento entregue aos espaços da ONU.
“A entrega da carta e da nota técnica ao Grupo de Trabalho Facilitador foi um marco importante no processo de incidência pelo reconhecimento das comunidades locais como sujeitos políticos no regime climático internacional. Ainda que as respostas estruturais à crise não venham dessas instituições, ocupar os espaços de decisão é estratégico. É uma forma de disputar narrativas e afirmar que não há justiça climática sem justiça territorial e sem a participação efetiva de quem cuida da terra há gerações”, destaca a assessora jurídica popular da Terra de Direitos, Bruna Balbi.
Marinalda Rodrigues, liderança do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), enfatiza que “não adianta falar em inclusão enquanto seguirmos excluídas Nossa participação precisa ser efetiva, respeitada e pautada em equidade”.
Há anos organizações sociais e movimentos populares destacam os obstáculos para a participação de povos tradicionais em espaços internacionais de tomada de decisão sobre a política do clima. De acordo com os grupos, as dificuldades vão desde a tradução dos debates e ausência de recursos como a reserva de assentos destinados à representação destes grupos.
Com a realização da Conferência das Partes sobre o Clima (COP30) em Belém, em novembro, organizações e redes de representação de povos tradicionais tem intensificado a denúncia da ausência de condições e das restrições para a participação. A participação de povos na COP e na política climática também é o tema da publicação lançada pela Terra de Direitos, em maio.
Reivindicações
Na carta os signatários reivindicam ao Secretariado da Convenção-Quadro da ONU que realize uma consulta às organizações de povos e comunidades tradicionais da América Latina e Caribe, África, Ásia e outras regiões, como meio de garantir “equilíbrio regional e mecanismos de autoidentificação para a escolha de representantes” no âmbito da Plataforma de Comunidades Locais Povos Indígenas (LCIPP).
O grupo ainda destaca como essencial a inclusão formal dessas comunidades na implementação do Plano de trabalho de Baku. Aprovado na COP29, realizada em 2024 no Azerbaijão, o plano tem forte foco em ações de financiamento climático. Na carta, as organizações e redes enfatizam a importância de garantir que povos tradicionais participem de diálogos, eventos paralelos, contribuições técnicas e coprodução de conhecimento.
O grupo ainda reivindica a criação de um fundo de recursos financiados pelos países-parte da Convenção Quadro da ONU para garantir a participação de povos e comunidades tradicionais nas atividades e implementação de tradução e facilitação dos diálogos entre as lideranças, especialmente as situadas em regiões remotas ou historicamente excluídas
Conferência de Bonn
Até dia 26 de junho representantes de governos, órgãos da ONU, setor privado, especialistas, povos tradicionais, movimentos populares e organizações sociais se reúnem em Bonn, na Alemanha, na agenda anual entendida como uma reunião preparatória do maior encontro global do clima, a COP.
Nestes dias os órgãos subsidiários da Convenção Quadro das Mudanças Climáticas se reúnem e tomam decisões frequentemente acolhidas pela Conferência do Clima. Um dos órgãos avalia a implementação das decisões das COPs anteriores (Subsidiary Body for Implementation – SB) e outro fornece assessoria técnica científica sobre o tema clima (Subsidiary Body for Scientific and Technological Advice - SBSTA).
Eixos: Política e cultura dos direitos humanos