Acervo / Artigos



No Brasil, defender direitos humanos é caso de polícia, Justiça e morte


Violência se intensifica quando há diferentes omissões por parte do Estado

Foto: Dan Agostini / Mídia NINJA

É grave a situação enfrentada por quem defende direitos no país. A pesquisa "Na Linha de Frente: violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil", elaborada pelas organizações Terra de Direitos e Justiça Global, revela que nos últimos quatro anos foram ao menos 1.171 casos de violência contra defensoras e defensores de direitos.

Os dados mostram que defender direitos no país é caso de polícia, visto que a violência policial foi registrada em um quinto dos casos. É caso de Justiça, pois ao menos 10% dos casos de violência dizem respeito a processos de criminalização contra essas pessoas. É caso de morte, pois, no Brasil, entre 2019 e 2022, 169 pessoas foram assassinadas por conta de suas lutas. Ou seja, a cada mês, ao menos três pessoas acabaram mortas no país justamente por defenderem os direitos humanos.

Mas se lutar por direitos representa um risco de morte quando o Estado brasileiro não garante condições e proteção a essas pessoas, lutar por essas causas também é uma questão de vida. É a efetivação dos direitos —como à terra, ao território, à saúde, à educação, à igualdade racial e de gênero— que garante uma vida digna a essa população e, por extensão, uma sociedade democrática.

O olhar sobre alguns casos revela que a violência se intensifica —e atinge o seu grau mais grave, quando resulta em mortes— em um cenário de omissão do Estado nas mais diferentes formas. A não garantia dos direitos, mesmo aqueles previstos em lei ou na própria Constituição, e o não enfrentamento de questões estruturais, como a concentração fundiária, o racismo, o machismo e a exploração de territórios indígenas, que acentuam os conflitos, podem ser fatais.

É por isso que, quando analisamos a violência contra defensoras e defensores de direitos humanos, falamos de um processo de dupla vitimação, uma vez que essas pessoas e coletivos já sofreram anteriormente com a negação dos direitos pelos quais lutam.

Nos últimos quatros anos, enfrentamos o desafio de sobreviver a um governo declaradamente opositor aos movimentos sociais e a quem defende direitos. Agora, em um governo não opositor aos direitos, enfrentaremos o desafio de cobrar do Estado a efetivação das mais diferentes políticas públicas que possam garantir a segurança dessas pessoas e instituições. Não apenas será necessário fortalecer uma política de proteção como também agir sobre as raízes da desigualdade que originam esses conflitos.

Esse é um compromisso que precisa ser assumido pelo Executivo, mas também pelo Legislativo e Judiciário. Está nas mãos dos Poderes decidir sobre a efetivação ou a violação de direitos historicamente exigidos por populações vulneráveis. Tramita no Senado Federal o projeto de lei 2.903/2023, que estabelece um marco temporal para a demarcação de terras indígenas e que, na prática, pode inviabilizar novas demarcações. Decisão semelhante sobre o estabelecimento de um marco temporal será tomada pelo Supremo Tribunal Federal.

Essa e outras medidas dos diferentes Poderes sinalizarão a real disposição do Estado brasileiro em assegurar proteção a quem defende direitos ou expor, ainda com mais intensidade, defensores e defensoras à morte.


Autoras: 

Alane da Silva - Assessora jurídica da Terra de Direitos

Glaucia Marinho - Coordenadora da Justiça Global



Notícias Relacionadas




Ações: Defensores e Defensoras de Direitos Humanos
Eixos: Política e cultura dos direitos humanos