Em julgamento histórico no STF, indígenas conquistam direito à saúde para enfrentar a pandemia
Assessoria de comunicação Terra de Direitos
Por unanimidade os ministros do Supremo Tribunal Federal determinaram nesta quarta-feira (5) que o Governo Federal adote medidas de proteção aos povos indígenas durante a pandemia de Covid-19. O julgamento reiterou a cautelar dada pelo ministro Luís Roberto Barroso no dia 8 de julho, dentro Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709.
A ADPF - um tipo de ação busca evitar ou reparar danos a algum princípio básico da Constituição – foi protocolada no final de junho pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com o PSB, PCdoB, PSOL, PT, REDE e PDT.
Com essa decisão, o governo terá 30 dias para elaborar um Plano de Enfrentamento da Covid-19 entre os povos indígenas, que preveja, entre outras coisas, medidas de contenção e isolamento de invasores nas Terras Indígenas. A cautelar também dava ao governo 10 dias para apresentar um plano de instalação de barreiras sanitárias em 31 terras indígenas de povos isolados. De acordo com Barroso, o plano foi apresentado pela União no dia 29 de julho.
Além disso, a decisão determina que Secretaria Especial de Saúde Indígena atenda todos os indígenas indistintamente, em terras indígenas homologadas ou não. Segundo o advogado da Apib, Luiz Henrique Eloy, indígena Terena, há relatos em que ao atendimento especial a indígenas de terras não demarcadas estava sendo negado. “Além de a União não demarcar Terras Indígenas, estava negando atendimento a essas comunidades. É uma violação grave de direitos”.
O resultado é uma conquista aos povos indígenas do Brasil, que pela primeira vez apresentaram uma ação no STF através de uma entidade representativa do movimento indígena. “Ela é histórica porque reconhece a legitimidade jurídica da Apib enquanto organização indígena para propor ação. Durante muito tempo os povos indígenas tiveram que depender de outros para falarem em seu nome e agora tem essa possibilidade de irem direto ao Supremo”, destaca Eloy.
A expectativa é que as medidas contribuam para diminuir o avanço da Covid-19 entre os povos indígenas – principalmente entre povos isolados. Segundo dados da Apib, até agora foram registrados 22.325 casos do vírus entre os indígenas, e 633 óbitos.
Indígenas do Baixo Tapajós
A Terra de Direitos e Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA) participam do julgamento na condição de amicus curiae, e apresentaram elementos relacionados aos indígenas do Baixo Tapajós.
Nenhuma das Terras Indígenas da região do Baixo Tapajós - que reúne 70 aldeias - é homologada. Em razão disso, os mais de 8 mil indígenas localizados nas cidades de Santarém, Belterra e Aveiros, no Oeste do Pará, tem - com frequência - seu acesso à saúde especial negado.
Coordenador do CITA, Ednei Arapiun comemora o resultado. Para ele, a maior vitória é a garantia de preservação da vida. “A vida dos indígenas do Baixo Tapajós e de todo o Brasil é o que mais importa”, afirma. Ele também destaca a importância de as medidas previstas na ADPF 709 se estenderem aos povos de terras indígenas ainda não demarcadas ou homologadas. “A gente precisa de um atendimento mais especial, de um acompanhamento ideal para a realidade de cada território, de cada povo”.
Pedro Martins, advogado popular da Terra de Direitos que também representou o CITA na ação, destaca a importância da conquista. “É importante precedente dos povos indígenas do Brasil, que tem seus direitos assegurados através de decisão da Suprema Corte”,
No julgamento, além de observarem os direitos indígenas previstos na Constituição Federal de 1988, os ministros também mencionaram outros tratados internacionais, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que reconhece o direito ao território e que assegura, entre outras coisas, o direito à consulta prévia aos indígenas em caso de medidas que impactem seus territórios. “O julgamento contribui para nortear a interpretação da Constituição Federal e garantir de maneira mais ampla os direitos indígenas”, avalia Martins.
Eixos: Política e cultura dos direitos humanos