Em Santarém (PA), cestas agroecológicas fortalecem agricultura familiar e ajudam quilombolas a enfrentar crise
Franciele Petry Schramm
Cestas adquiridas de produtores locais foram distribuídas para 200 famílias quilombolas; outras 800 pessoas de diferentes comunidades urbanas e extrativistas também receberam os alimentos.
Quando saem para pescar no Lago Maicá, os pescadores do Quilombo Bom Jardim, em Santarém (PA), voltam agora apenas com os peixes que vão consumir. Isso porque, neste momento de pandemia, as famílias pescadoras estão com dificuldade para vender sua produção. Essa é uma realidade comum para populações extrativistas, agricultores e agricultoras familiares na cidade, que começam a sentir os impactos financeiros na queda da renda.
Em razão dessa situação, um grupo de movimentos populares e organizações sociais se organizou para ajudar tanto quem precisar vender quanto quem precisa comprar, mas está com dificuldades financeiras.
Fruto dessa articulação, mais de 1.000 cestas agroecológicas com produtos oriundos da agricultura familiar foram distribuídas em Santarém desde o dia 12 de maio. Dessa forma, muitas famílias passam a ter a quem vender parte do que produzem, e outras famílias recebem uma cesta com alimentos diversos e de qualidade, com produtos regionais e sem agrotóxicos. Farinha de mandioca, tapioca, piracuí – uma farinha de peixe típica da região Amazônica - coco e castanha são alguns dos produtos que ajudam a manter a alimentação equilibrada neste momento em que é tão importante garantir a saúde da população.
No dia 15, foi a vez das famílias dos Quilombos Bom Jardim e Murumurutuba receberem essa contribuição. “Essa cesta para gente chegou em boa hora”, conta o presidente da Associação Comunitária de Bom Jardim, Narivaldo Santos. Na comunidade, com apoio da Terra de Direitos para a logística, 80 cestas foram distribuídas para algumas famílias mapeadas pela Associação, que avaliou aquelas que tiveram maiores impactos na renda em razão do coronavírus. “Algumas pessoas trabalham na diária, na cidade, não puderam mais estar indo trabalhar. E aí também a questão do pescado ficou um pouco mais difícil”, explica. Outras 120 cestas foram distribuídas entre as famílias de Murumurutuba.
Comida de verdade
Além de ajudar as famílias do Bom Jardim, a iniciativa das cestas agroecológicas também fortalece outros quilombos de Santarém: a banana, o jerimum e a pimentinha que integram a cesta foram adquiridas de produtores do Quilombo Saracura.
A distribuição das cestas faz parte de um mesmo projeto desenvolvido pela Associação Comunitária de Moradores e Produtores Agroextrativistas de Surucuá (Amprosurt), localizada na Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, e pela Cooperativa Mista da Flona do Tapajós (Coomflona), localizada na cidade de Belterra (PA). A ação conta com apoio de uma fundação. Nesse projeto, está prevista a aquisição de 4 mil cestas agroecológicas para serem distribuídas em Santarém e nas cidades de Belterra, Aveiro, Rurópolis e Mojuí dos Campos.
As cestas são distribuídas também através de parcerias estabelecidas com entidades como a Terra de Direitos, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR), a Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS), a Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), a Colônia de Pescadores Z-31, e outras 9 organizações.
Representante da Amprosurt, Mayá Schwade explica que as cestas foram montadas pensando no fortalecimento dos pequenos produtores e também na saúde das pessoas. “A gente consultou especialistas em nutrição para montar uma cesta equilibrada. Esses produtos – além de serem regionais, de serem produtos que as pessoas estão acostumadas a consumir –, eles têm uma composição com vitaminas para o fortalecimento da saúde, principalmente nesse momento em que a gente tem essa crise de saúde tão grave”, conta. A opção por alimentos agroecológicos, sem veneno, também faz parte lógica de produção das famílias da Amprosurt, que forneceu boa parte dos produtos. A Associação formada majoritariamente por mulheres foi criada em 2015. “A Amprosurt foi formada com o objetivo de gerar renda, mas também gerar discussões para a qualidade de vida dessas famílias”, explica Mayá.
Para a montagem das cestas, além da produção de extrativistas, agricultores e agricultoras familiares, alguns itens básicos que não são produzidos pelas famílias também foram adquiridos. Mesmo assim, itens como arroz, feijão, açúcar, detergente e água sanitária foram comprados em pequenos mercado, para fortalecer os comerciantes locais.
Em Santarém, as cestas também foram distribuídas na Resex Tapajós-Arapiuns e em comunidades urbanas da cidade.
Ações: Biodiversidade e Soberania Alimentar, Quilombolas
Eixos: Biodiversidade e soberania alimentar, Política e cultura dos direitos humanos