10 dúvidas sobre a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola
Conheça um pouco mais sobre essa política fundamental para desenvolvimento das comunidades quilombolas.
Lançada no Dia Nacional da Consciência Negra de 2023 e coordenada pelo Ministério da Igualdade Racial, em colaboração com demais ministérios, estados e municípios, a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola (PNGTAQ) estabelece medidas que, implementadas de modo integrado, buscam garantir a sustentabilidade dos modos de vida, as atividades produtivas e o manejo das comunidades quilombolas, com respeito à identidade e ancestralidade de cada território tradicional.
Mas, com quase um ano do lançamento, as dúvidas são frequentes entre os quilombolas. A União, os estados e municípios ainda têm dado os passos iniciais para implementação dessa política.
Por isso, a gente reuniu 10 perguntas sobre a PNGTAQ. O objetivo é disponibilizar as informações essenciais para que as comunidades quilombola país afora possam avaliar e reivindicar a implementação da política nos seus territórios.
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O que é a PNGTAQ?
Como os territórios quilombolas ainda vivem um contexto de alta vulnerabilidade, de não acesso a diversos direitos (território, saúde, moradia, alimentação, saneamento, assistência técnica para trabalho, etc), e como cada território quilombola possui características próprias, é preciso desenvolver uma política que contribua para materializar os direitos fundamentais e o desenvolvimento comunitário considerando a forma como a própria comunidade “gestiona” o território tradicional.
É necessária então uma política com medidas que considerem a autogestão e autonomia da comunidade para decidir, por exemplo, como deseja manejar a terra para geração de renda e para produção de alimentos para consumo próprio, onde e em que período do ano irá fazer as roças, quais são e como preservar seus espaços sagrados, como avaliam caminhos para geração de renda, quais os potenciais de turismo de base comunitária, entre outras.
Assim, a PNGTAQ tem como objetivo central implementar um conjunto de várias políticas (geração de renda, saúde, agricultura, cultura, etc) de modo integrado que funcionem a partir do princípio de autonomia da comunidade para determinar o que é importante para seu desenvolvimento.
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Como a PNGTAQ foi construída?
Reivindicada pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), a Política é fruto de uma construção coletiva de mais de dez anos com diversos atores como governo, as próprias comunidades quilombolas e parceiros. Esses passos incluem a criação, em 2013, de um grupo de trabalho envolvendo o Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Conaq e outros. Depois, foram realizados, entre os anos de 2015 e 2018, dois ciclos de oficinas locais, regionais e nacionais com comunidades quilombolas e poder público para realização de escuta e debates. A partir disso foi elaborado um conjunto de diretrizes preliminares para formulação da política. E então a construção da política parou durante os Governos Temer e Bolsonaro, de 2018 a 2022.
Em 2023, os trabalhos foram retomados. Em março foi instituído o Programa Aquilomba Brasil (Decreto 11447/2023) que continha, entre seus objetivos, a formulação e implementação de uma política nacional de gestão territorial e ambiental. Sob coordenação do Ministério da Igualdade Racial, foi criado um grupo de trabalho específico para formulação da PNGTAQ. Após diversas reuniões e elaborações, em novembro de 2023, a PNGTAQ foi lançada.
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Como a Política está estruturada?
A PNGTAQ tem 5 eixos: 1) Integridade territorial, usos, manejo e conservação ambiental; 2) Produção sustentável, geração de renda, soberania alimentar e segurança nutricional; 3) Ancestralidade, identidade e patrimônio cultural; 4) Educação e formação voltadas à gestão territorial e ambiental; 5) Organização social para a gestão territorial e ambiental.
Cada um dos 5 eixos tem objetivos específicos, de modo a garantir que um território quilombola tenha um desenvolvimento não apenas em uma frente de ação, mas de modo integrado.
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Qual órgão é responsável pela implementação desta Política?
A Política Nacional deve ser implementada pela Governo Federal. É o Ministério da Igualdade Racial (MIR) que coordena a política. No entanto, como envolve demais áreas, a implementação demanda ação conjunta do MIR e demais ministérios, como o da Educação, do Desenvolvimento Agrário e da Cultura.
Como estão mais próximos das realidades das comunidades quilombolas, os estados e municípios podem ser responsáveis por implementar as políticas de competência também destas esferas, como a titulação quilombola (em alguns estados), saneamento básico, educação, segurança alimentar, entre outros.
Organizações sociais, universidades e outras entidades também podem trabalhar em cooperação com as comunidades quilombolas. É possível, por exemplo, que organizações contribuam na realização de formações e no apoio para elaboração de planos de ação pelas comunidades.
Há ainda o Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola. Composto por representantes de Ministérios e organizações representativas quilombolas, o colegiado tem por função planejar, coordenar, articular, monitorar e avaliar a execução da PNGTAQ, entre outras tarefas.
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Como a política nacional deve funcionar?
A implementação da Política Nacional deve acontecer prioritariamente pela construção e desenvolvimento dos planos locais de gestão territorial e ambiental. Esses planos devem ser formulados, aprovados, geridos e monitorados pelas próprias comunidades quilombolas, conforme os usos, as dinâmicas, os costumes e as tradições de cada território.
Os planos locais indicam as demandas das comunidades quilombolas, as áreas e assuntos mais frágeis e que exigem maior investimento (por exemplo, assistência técnica rural, logística para distribuição de alimentos, acesso a luz e água encanada). Também indicam as áreas do território que devem ser destinadas para o plantio de alimentos, para habitação, para lazer, para construção de aparelhos públicos. Enfim, o plano traça toda a organização e disposição territorial da comunidade.
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Como esta política pode contribuir como desenvolvimento da minha comunidade quilombola?
Como trata-se de um plano que indica para o poder público, organizações, universidades e outros atores sobre prioridades e demandas de investimentos nestes locais, e como fazer essa aplicação de recursos, a incidência e adoção de medidas considera o que a própria comunidade aponta como importante.
Muitas das políticas voltadas para comunidades quilombolas foram pensadas de cima para baixo ou com baixa participação direta dos beneficiários, sem considerar e reconhecer as realidades especificas de cada comunidade. Nesta política é a comunidade que irá instruir o planejamento das políticas públicas locais.
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E quem é responsável por financiar esta política?
Como envolve uma ação integrada e de várias áreas, o orçamento para desenvolvimento das ações presentes nos planos locais das comunidades quilombolas podem ser oriundos de órgãos de todas as esferas públicas - da União, dos estados e dos municípios.
Para isso podem prever orçamento próprio (da União, do estado ou município) na Lei Orçamentaria Anual, nos Planos Plurianuais e na Lei de Diretrizes Orçamentarias (LDO) para as ações presentes no plano. É possível também que municípios, estados e Uniao criem mecanismos de captação de recursos privados para financiamento da PNGTAQ, de acordo com regulamentação específica. Outra via é a aprovação de emendas parlamentares (das diferentes esferas) para destinação de recursos.
São os planos locais de gestão territorial e ambiental que podem orientar a aplicação dos recursos decorrentes das diferentes fontes.
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Não temos o título do território. Esta política vale para minha comunidade?
Esta política pode ser implementada em territórios quilombolas certificados pela Fundação Palmares.
Quando o plano local demandar por construção de imóveis (como casas, escolas, galpões, barracões) é necessário que a comunidade quilombola tenha o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação publicado em Diário Oficial dos Estados ou da União. Essa exigência é uma medida de segurança para garantir que os imóveis sejam construídos em fase do processo de titulação em que já há maior segurança fundiária para comunidade, para garantir que os imóveis permaneçam como bem coletivo da comunidade e não corram risco de serem apropriados por terceiros.
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A nossa comunidade quilombola possui diversas fragilidades e precisamos garantir o desenvolvimento territorial. Que passos devemos dar para reivindicar a implementação da política no nosso território?
O primeiro passo é a comunidade quilombola receber as informações necessárias para avaliar a reivindicação da implementação da política em seu território. Essa dimensão é do direito à informação. O Estado deve prover estas informações. Parceiros, como organizações e universidade podem contribuir nesta etapa.
Já com informações sobre a Política, a comunidade pode se articular com as representações regionais de organizações quilombolas (como a Malungu, no Pará; a Fecoqui, no Paraná; a Coeqto, no Tocantins) para reivindicar ao município ou ao estado a se comprometer em aderir, implementar e executar à Política.
O passo seguinte, após a manifestação de adesão pelo município ou estado a PNGTAQ, é o de envio de ofício pelas organizações quilombolas, município ou estado para a Secretaria de Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, Povos de Terreiros e Ciganos do Ministério da Igualdade Racial.
Este ofício deve conter os dados do governante responsável (prefeito ou governador), termo de adesão preenchido (veja modelo de termo). O MIR abrirá um processo e, após conclusão, a adesão é publicada no Diário Oficial da União.
Para acompanhamento, controle social e participação direta das comunidades, é importante que os municípios e estados constituam comitês locais para gestão da política, com composição ajustada para as realidades de órgãos e representações locais.
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Como a PNGTAQ pode se configurar como medida de prevenção à crise climática nos territórios quilombolas?
Há pelo menos duas dimensões que a Política dialoga com prevenção e redução de impactos pela crise climática.
A primeira dimensão é que, ao definir prioridades e demandas no plano local, a comunidade aponta quais são suas áreas no território que possuem vulnerabilidade de contaminação, de seca, de inundação, de práticas ou assédio de desmatamento por terceiros, entre outros. Com isso podem ser traçadas e desenvolvidas medidas de prevenção e de enfrentamento às causas que expõem à comunidade à riscos. Alguns exemplos: a comunidade pode traçar um plano de evacuação de emergência, de recuperação de uma nascente de rio e mesmo de reocupação territorial, considerando possíveis mudanças de cenário pela crise climática (como situações de enchentes).
Outra dimensão é o papel dos territórios na conversação e preservação do meio ambiente. Os planos locais documentam as ações das comunidades no manejo sustentável da terra, das florestas, da contribuição para preservação da biodiversidade, no resgate de sementes, entre outros. Esse registro documenta e expõe o que as comunidades já fazem há muitos anos para a preservação dos territórios e da biodiversidade.
Ações: Quilombolas
Eixos: Política e cultura dos direitos humanos