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CTNBIO: Terra de Direitos reage à artigo do jornal Estado de São Paulo


O Estado de SP, 16/08 Direito de veto paralisa CTNBio, artigo de Fernando Reinach

Imagine uma situação surreal: uma comissão cuja missão é certificar a segurança dos aviões na qual um grupo contrário à existência de aviões tenha um único assento para, democraticamente, expressar seu ponto de vista.Imagine agora que seja exigida a unanimidade da comissão para aprovar qualquer avião. Na prática, essa combinação de assento e quórum permite ao grupo contrário vetar qualquer aeronave.Infelizmente, é exatamente isso que tem paralisado a atuação da Comissão Técnica de Biossegurança (CTNBio), responsável por garantir a segurança dos produtos biotecnológicos. O resultado é a redução da competitividade da agricultura nacional, ao mesmo tempo em que o governo comercializa produtos transgênicos de maneira ilegal.Enquanto o Ministério da Saúde aplica uma vacina contra a hepatite B produzida em um organismo geneticamente modificado (OGM) não certificado e os diabéticos recebem do governo insulina produzida em OGMs, os agricultores que plantam sementes de algodão transgênicas contrabandeadas são perseguidos, a Embrapa e as universidades têm suas pesquisas paralisadas. Você pode imaginar que, não sendo diabético ou agricultor, está livre da ilegalidade e dos transgênicos. Não é verdade, eles já estão em nossa vida há muito tempo.A maioria dos queijos que comemos é provavelmente ilegal, uma vez que o leite foi coagulado com enzimas produzidas em OGMs não certificados e até o sabão em pó pode ser ilegal, pois contém enzimas produzidas em OGMs. A lei de Biossegurança exige que a CTNBio produza "decisão técnica, caso a caso, sobre a biossegurança de OGM e seus derivados" pois, apesar de os produtos biotecnológicos serem seguros, a tecnologia ainda é nova e exige monitoramento. Na primeira versão da lei, a CTNBio era composta majoritariamente por cientistas, representantes de ministérios e órgãos de defesa do consumidor.Uma série de vetos e decretos causou tamanha confusão jurídica que a comissão passou anos paralisada por medidas judiciais, obrigando o congresso a promulgar nova lei em 2005.A CTNBio foi ampliada e foi criado um conselho de ministros para tratar dos aspectos políticos dos OGMs, preservando o caráter técnico da comissão. Na nova comissão, os especialistas em biossegurança deixaram de ter maioria.O legislativo, com base na composição da comissão, decidiu que o quórum necessário para a aprovação dos produtos deveria ser de maioria simples, forçando o debate e evitando que qualquer grupo isoladamente pudesse aprovar ou vetar qualquer decisão. Promulgada a lei, o governo Lula resolveu vetar os artigos que definiam qual seria o quórum necessário para a CTNBio decidir. Em seguida, por decreto, alterou a lei original, aumentando o quórum exigido para a aprovação de qualquer liberação comercial de OGM.Na prática, o novo quórum nada mais é que um direito de veto concedido aos representantes de grupos que desejam um "Brasil Livre de Transgênicos". O governo, ao permitir a paralisia da CTNBio, ao mesmo tempo viola a lei de biossegurança e está pondo em risco a segurança da população e o progresso da agricultura.Para que a segurança dos produtos biotecnológicos seja avaliada tecnicamente, com base em critérios científicos, esse direito de veto, travestido de quórum, precisa ser revogado. Resposta da Terra de Direitos : Sr. Fernando, Sobre sua matéria, publicada hoje no Estado de São Paulo, creio ser necessário levar a público algumas correções, pois algumas imprecisões comprometem a compreensão dos leitores sobre o assunto. Em primeiro lugar, como deve ser de seu conhecimento, as decisões da CTNBio não necessitam ser unânimes, como o sr. afirma. O quórum para liberações comerciais é de 2/3 dos votos. As discordâncias em relação à maioria tem que ser fundamentadas cientificamente. Aliás, também cabe esclarecer que não há distinção "técnica" entre os membros da Comissão. Todos, como exige a lei, são doutores e com notável saber na área de atuação.Questionamentos técnicos que incluem a revisão de normas de biossegurança anteriormente estabelecidas e critérios mais rígidos de biossegurança não podem ser caracterizados como "questões políticas". Como biólogo comprometido com a biossegurança e colaborador de um jornal de grande circulação sugiro ao srº que solicite à Secretaria Executiva da CTNBio as transcrições das reuniões até aqui realizadas, e as leia com atenção. Eu fiz isto. Pude verificar que até agora, não há paralisia nas reuniões. Muito pelo contrário. Para comprovar isto, sugiro também que o sr. faça uma comparação com o rendimento da Comissão em 2004, ano em que a mesma funcionou. Até o momento, em apenas 06 reuniões, foram analisados mais que o triplo de processos em 2004. Eu, como assessora jurídica de uma organização socioambientalista, sempre questionei ao lado de outras organizações movimentos sociais e cientistas o marco regulatório sobre a biossegurança no Brasil. Na época, defendíamos que a avaliação de risco deveria ser feita pelo IBAMA e pela ANVISA, como ocorre com todos os outros alimentos, medicamentos e produtos não transgênicos. Como foi feito com a vacina contra a Hepatite B que o sr. menciona. Aliás, esta vacina foi testada por anos pela Fiocruz e pela própria ANVISA, como o sr. também deve saber.Para nós, não havia sentido em que um órgão com estrutura institucional de órgão consultivo, como a CTNBio, tivesse competência legal para fazer avaliações de risco. Ocorre, que durante o período de aprovação da Lei de Biossegurança, as indústrias de biotecnologia e alguns pesquisadores fizeram uma pressão enorme para que as decisões fossem concentradas na CTNBio, até então, um órgão consultivo. Agora, os mesmos cientistas e as mesmas indústrias de biotecnologia usam a mídia para conseguir mais modificações na legislação. Curiosamente, são os mesmos que defendem que a legislação de rotulagem "não precisa ser cumprida" e que também reagiram muito mal à presença do Ministério Público Federal nas reuniões da Comissão. Este comportamento causa estranheza em qualquer cidadão. Por quê o medo do debate? Por quê a insistência na falta de transparência? As organizações da sociedade civil e movimentos sociais continuarão atentos ao trabalho da CTNBio. Para nós, lobby não pode ser confundido com interesse nacional. Por isso, enviamos a Carta que segue abaixo aos Ministros do Conselho Nacional de Biossegurança. Como o sr. poderá perceber, assinam este documento organizações de agricultores, de consumidores e da área da saúde. Esperamos que os interesses de biossegurança destes setores da sociedade sejam respeitados pela CTNBio e pelo Governo Brasileiro. Atenciosamente, Maria Rita Reis Assessora Jurídica da Terra de Direitos www.terradedireitos.org.br Autor/Fonte: Terra de Direitos



Ações: Biodiversidade e Soberania Alimentar

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