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Famílias vivem sob tensão do despejo


Morar em um local sem água encanada, esgoto ou eletricidade e viver na tensão de poder ser despejado a qualquer momento. Este é o preço que muitas famílias de uma área de invasão no bairro Tatuquara, em Curitiba, pagam, desde setembro do ano passado, para tentar tornar realidade o sonho da casa própria.

Nove meses depois da ocupação, alguns até adquiriram o direito de posse de um lote, mas sem a certeza ou garantia de efetivação do negócio. Isso porque a 11.ª Vara Cível de Curitiba já concedeu uma liminar de reintegração de posse da propriedade, conhecida como Fazenda da Ordem. Apesar disso, os moradores continuam a viver na área de oito alqueires.A presença de famílias aumentou desde o início da "invasão", ocorrida no feriado de 7 de setembro.

Na época, 80 barracos de plástico se instalaram na fazenda. Hoje, são cerca de 500 famílias distribuídas em barracos, casas de madeira e até mesmo de alvenaria. Ruas foram abertas, a luz elétrica foi "puxada" e até uma entidade representativa foi criada há dois meses: a Associação dos Moradores Jardim Bela Vista. Valorização Junto com a organização da comunidade veio também a valorização do "direito" de posse dos lotes ocupados, que significa a compra não legalizada deste espaço. Um mês após a invasão, este negócio poderia ser feito pelo valor de aproximadamente R$ 150, segundo alguns moradores.

Hoje, já existem lotes cotados a R$ 3 mil, dependendo da localização. O direito de posse não é legal e apenas "autoriza", de maneira informal, a ocupação do lote. De acordo com o presidente da associação de moradores, Cide Alves Carneiro, a maioria dos moradores é formada por pessoas que compraram o direito de posse dos lotes. "Estamos tentando ajeitar a situação do pessoal, mas até agora o que estamos fazendo é por nossa conta", explica. Os moradores estão cientes do risco que correm, mas dizem não ter outra alternativa de moradia.

A auxiliar de cozinha desempregada Francieli Cristina dos Santos, 23 anos, faz parte da minoria que mora no local desde a invasão. Ela veio de Nova Esperança, no interior do estado, há oito anos, e conta que chegava a gastar mais da metade do que ganhava para pagar o aluguel da casa onde morava antes, na Vila São Pedro. "A gente passava muito sufoco. Não sobrava dinheiro nem para comprar comida." Grávida de cinco meses e mãe de uma menina de 8 anos, Francieli revela que o pior já passou. "No começo (da invasão), a gente passou sede e tinha gente que ficava até sem tomar banho."

Mas todo esforço, segundo ela, tem a sua recompensa. "Agora tenho o meu cantinho e a gente tem de lutar por ele. Com o salário que ganhava nunca ia conseguir comprar nada." Risco O coordenador de regularização fundiária da Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab), Marco Aurélio Becker, diz que as pessoas que moram na Fazenda da Ordem correm o risco de ser despejadas a qualquer momento. Segundo ele, a comercialização do direito de posse dos lotes, apesar de ilegal, é uma prática comum nas invasões. "Ocupação não é a solução.

Só serve para a especulação e põe em risco as pessoas que podem ser despejadas." Becker diz que com o dinheiro gasto para construções e compra dos direitos de posse, os moradores poderiam ter adquirido um lote pela Cohab. Segundo ele, há 38 mil pessoas cadastradas na capital e a fila de espera tem demorado em média 5 anos. Como a área invadida está em discussão na Justiça, Becker afirma que não há como regularizar a situação dos moradores no local.

Autor/Fonte: Gazeta do Povo - 15/06/2005



Ações: Conflitos Fundiários

Eixos: Terra, território e justiça espacial