Organizações sociais cobram participação popular em grupo de trabalho sobre regularização fundiária no Pará
Assessoria de comunicação Terra de Direitos
Entidades alertam para os riscos à democracia, transparência e legitimidade do GT que discute a destinação de terras públicas no estado.
Organizações sociais entregaram, nesta quinta-feira (22), uma carta à Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais (CTD), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), reivindicando a inclusão de representantes da sociedade civil no Grupo de Trabalho (GT) que irá discutir a destinação de terras públicas estaduais e federais no Pará. A carta foi entregue em Brasília (DF), durante a primeira reunião oficial do grupo. As organizações aguardam resposta do Ministério.
No documento, as entidades signatárias alertam que a ausência de vagas para representantes de organizações sociais e movimentos popular na composição do Grupo de Trabalho coloca em risco a construção democrática de ações e compromete a legitimidade, efetividade e transparência das medidas a serem tomadas.
O Grupo de Trabalho, instituído pela Resolução nº 18, de 14 de maio de 2025 pelo MDA, em parceria com o Governo do Pará, não garante a participação formal de organizações sociais, movimentos ou povos e comunidades tradicionais. Pela resolução, a participação de organizações é apenas na condição de eventuais convidadas, o que não garante participação permanente e com poder de voto.
Para as entidades, essa forma de participação não é efetiva. “Não basta chamar a sociedade civil como convidada eventual. Isso não garante voz, nem acompanhamento técnico e político das decisões que impactam diretamente os territórios e os modos de vida de milhares de famílias”, afirma a nota.
Na manifestação pública as organizações destacam que a composição atual do Grupo de Trabalho exclui justamente “organizações que atuam há décadas nos territórios diretamente impactados pelos conflitos fundiários e ambientais no Pará”, aponta outro trecho.
Nesse cenário, as organizações alertam que a presença da sociedade civil não é apenas recomendável, mas indispensável para que o grupo cumpra seu papel de mediação de conflitos e construção de soluções legítimas e duradouras. “É nos territórios que se acumulam os maiores conhecimentos sobre os desafios da destinação fundiária. Ignorar essas vozes é repetir erros históricos”, pontua a carta.
“Parabenizamos o processo de construção da Câmara, mas também queremos destacar a importância da representação da sociedade civil e da participação social na construção desses espaços. E quando falo de participação social, estamos falando da representação dos diversos segmentos e povos nesses processos de discussão. É importante que estejam representados os povos indígenas, as comunidades quilombolas, tradicionais e os ribeirinhos. Não tem como a gente fazer essa discussão de destinação de terras públicas sem a presença desses grupos”, afirmou Alane Luzia Silva, assessora jurídica da Terra de Direitos, durante a reunião.
Conflitos fundiários no Pará
O estado do Pará lidera os indicadores de violência no campo, segundo dados apresentados em abril no Caderno de Conflitos no Campo do Brasil 2024, elaborado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).
O estudo Na Linha de Frente: violência contra defensores e defensoras de direitos humanos no Brasil, elaborado pela Terra de Direitos e Justiça Global, aponta que entre os anos 2019 e 2022, o Pará registrou o maior número de violências contra quem defende direitos humanos no Brasil, e os povos indígenas foram as principais vítimas.
Após visita ao Pará e demais estados, a relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) Mary Lawlor também destacou, em março deste ano, que no Brasil a violência está enraizada no conflito pela terra.
Reivindicações
Além da alteração imediata da Resolução nº 18 para garantir a participação formal e paritária da sociedade civil no GT, as entidades reivindicam a edição de um decreto estadual sobre ordenamento territorial e o funcionamento imediato da Câmara Técnica Estadual de Destinação de Terras Públicas – criada em 2020, mas até hoje inoperante.
“Estamos dispostos a contribuir com critérios de representatividade e conhecimento técnico. Mas isso só será possível com uma alteração urgente na Resolução nº 18, que assegure nossa participação como membros efetivos do GT”, declara a nota.
O Grupo de Trabalho Pará
O Grupo de Trabalho (GT) que trata da destinação de terras públicas no Pará integra a Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais (CTD), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA).
Sua criação ocorreu após a revisão de áreas indicadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como de interesse para demarcação de territórios indígenas. A sinalização resultou no bloqueio dessas áreas no Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), medida que foi posteriormente revista após intensa articulação política do governador do Pará junto ao Governo Federal.
O GT foi oficialmente instituído por meio de parceria entre o MDA e o Governo do Estado do Pará e tem o prazo de 90 dias para reunir propostas sobre a destinação das terras estaduais e federais para regularização fundiária.
Ações: Conflitos Fundiários
Eixos: Terra, território e justiça espacial