TPP Canadá termina com responsabilização das empresas e do Estado canadense por violações aos direitos humanos
Terra de Direitos
Por Priscylla Joca*, para Combate Racismo Ambiental em 01/06/14
Ao longo deste último dia, participantes e convidados discutiram as injustiças causadas pelas empresas de mineração canadenses na América Latina, enquanto os juízes se reuniam para deliberar. Um pouco antes das 17 horas, horário local, o Tribunal voltou ao auditório para anunciar sua decisão. O documento foi apresentado em francês, inglês e espanhol. Abaixo, socializamos uma primeira versão do texto lido pelos juízes. O documento na íntegra será divulgado ainda esta noite, em Montreal.
Veredicto
Estamos com certeza diante de fenômenos globais, com padrões de comportamentos similares e que comportam um maior número de empresas transacionais. No caso da indústria de mineração, eles resultam não apenas da lógica de funcionamento da indústria transacional; a essa se soma a forma bastante agressiva que caracteriza a indústria extrativista, que impacta comunidades e povos.
O TPP se constitui nessa ocasião para julgar as companhias de mineração canadenses e, ao mesmo tempo, para julgar as acusações atribuídas ao Estado do Canadá. E o TPP identifica vários níveis de responsabilidade:
- As empresas falham ao violarem garantias de direitos humanos ratificadas em documentos internacionais;
- Por outro lado, o Estado do Canadá falha ao não proteger os Direitos Humanos, prevenindo e responsabilizando essas violações. Há responsabilidade por ação e omissão. Quando não reprime as empresas que violam direitos; quando nega o acesso à justiça às vítimas, proporcionando recursos efetivos [para garantirem seus direitos]; quando deixa de tomar medidas adequadas ou de exigir que as empresas mineiras o façam.
Como é sabido, a indústria de mineração lida com projetos em grande escala, que se contrapõem aos direitos à autodeterminação dos povos.
A responsabilidade dos Estados de destino se configura quando concedem licenças de funcionamento para essas empresas sem atentar para os impactos de violações aos Direitos Humanos e sem garantir o direito à consulta e ao consentimento livre e informado.
Esses Estados têm responsabilidade também quando flexibilizam suas normas trabalhistas, ambientais e tributárias, e quando colaboram com as atividades das empresas. Incorrem nas mesmas responsabilidades quando criminalizam as atividades das pessoas que reivindicam o direito à autodeterminação e aos direitos fundamentais. E também incorrem em responsabilidade por omissão quando deixam de exigir medidas para coibir as violações por parte das empresas.
O TPP escutou testemunhos de vítimas e de especialistas.
Os casos examinados demonstram que há violações aos Direitos Humanos. Os testemunhos comprovam que as empresas que atuam no México, Honduras, Guatemala e Chile ferem os direitos à vida, à alimentação, à água, à saúde, à habitação, à segurança, ao meio ambiente, bem como violam os direitos dos povos à autodeterminação, às terras e aos recursos naturais.
Ademais, violam também o direito à participação, à consulta e ao consentimento prévio, livre e informado; ao desenvolvimento, à escolha e ao exercício pleno de culturas e tradições.
A expansão da mineração na América Latina não teria sido possível sem o apoio do Estado canadense. A intervenção do Canadá tem-se dado por meio de apoio político e ingerência nos projetos legislativos nos Estado de destino; apoio econômico e financeiro através de créditos e investimentos; barreiras no acesso à justiça para pessoas afetadas pela atividade mineira canadense.
Com base nessas considerações, declara-se a responsabilidade das empresas Blackfire Exploration e demais por violações aos direitos humanos e ambientais. Outrossim, declara-se a responsabilidade do Estado do Canadá por não só não haver prevenido, como ter facilitado, tolerado e encoberto essas violações”.
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*Priscylla Joca é Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Ceará. Colaboradora do Coletivo Flor de Urucum – Assessoria em Direitos Humanos, Comunicação e Justiça, integra também a Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares no Ceará (RENAP-CE). Pesquisadora em Direitos Humanos ligada ao Instituto de Pesquisa Direitos e Movimentos Sociais, mora atualmente em Montreal, Canadá. O acompanhamento do Tribunal Permanente dos Povos está sendo sua primeira colaboração para Combate Racismo Ambiental.
Ações: Empresas e Violações dos Direitos Humanos
Eixos: Política e cultura dos direitos humanos