Para proteger mais velhos do coronavírus, indígenas da TI Maró proíbem entrada nas aldeias, em Santarém (PA)
Franciele Petry Schramm
Antes mesmo de o governo do Pará publicar na metade de março o decreto 609, que adotou medidas de enfrentamento ao Coronavírus, indígenas da TI Maró, em Santarém, saíram na frente e construíram um protocolo próprio para se protegerem do vírus.
Desde que a Organização Mundial de Saúde declarou o coronavírus uma pandemia global, no dia de 11 de março, nenhuma pessoa entra ou sai do território indígena, que está distante 14h de barco do centro de Santarém. Essa é uma forma de garantir que pessoas que estejam contaminadas não ingressem na TI, ondem vivem cerca de 300 indígenas das etnias Borari e Arapium.
Um dos líderes do território, Poró Borari explica que as aulas e as visitações à área foram suspensas temporariamente, antes mesmo de haver a confirmação de casos de Covid-19 em Santarém. Agora, a cidade tem dez casos confirmados e o registro da morte de uma senhora indígena, na Vila de Alter do Chão, em razão do vírus.
O temor pela saúde das pessoas mais velhas é um dos principais fatores que levou à adoção dessas medidas. “Não podemos correr o risco de colocar a vida dos nossos velhinhos em jogo nesse momento”, explica. “A gente respeita muito os mais velhos, pois eles são os detentores de todo os saberes tradicionais, da memória viva de todo o conhecimento ancestral indígena”, completa.
Poró explica que as medidas seguem por tempo indeterminado – mesmo que o governo federal insista que a pandemia não é motivo para pânico e que atividades em todo o país devem ser retomadas. “Independentemente de o presidente estar abrindo as portas de várias fronteiras, a gente está fechando aqui. Justamente por precaução à saúde do nosso povo”.
O fechamento da entrada e saída de pessoas vindas de fora também é uma forma de manter a rotina nas três aldeias que formam a terra indígena. Diferente do isolamento familiar feito nos centros urbanos, no território o isolamento é comunitário. “O nosso isolamento é totalmente diferente da vida urbana: a gente continua na aldeia, não vai mais para [o Centro de] Santarém, mas continua a caçar, pescar e trabalhar. Essa é a nossa vida”, conta Poró.
Orientações
O fechamento para acesso às aldeias também é uma das orientações dadas pelo Conselho Indígena Tapajós Arapiuns, o CITA. A entidade que representa 13 povos indígenas na região do Baixo Tapajós tem cobrado dos órgãos do governo e da Secretaria Especial de Saúde Indígena, a Sesai, a criação de um plano de emergência para contenção do vírus nas aldeias.
“Além de cobrar os órgãos competentes, nós temos orientado nossas aldeias, os parentes, para que não saiam dos territórios. Muitas aldeias ainda não estão tendo consciência da gravidade do problema, então muitos estão indo e vindo para cidade”, destaca a presidente em exercício do Cita, Auricélia Arapiuns.
A vinda periódica para o centro de Santarém também se torna uma necessidade para as pessoas que precisam utilizar serviços bancárias para sacar o salário ou aposentadoria. Além disso, Auricélia conta que as aldeias começam a sofrer com a falta de materiais de higiene ou de alimentos. “Mas o nosso apelo é para os parentes fiquem em casa, evitam aglomerações e digam para a gente se precisam de alguma coisa”, destaca.
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Casos Emblemáticos: Terra Indígena Maró
Eixos: Política e cultura dos direitos humanos