Manifesto de apoio ao Movimento Ocupe Estelita
Terra de Direitos
As entidades da sociedade civil e movimentos sociais abaixo signatários, vem, por meio desta nota pública, declarar apoio ao Movimento Ocupe Estelita, por ser esta uma luta de todas as pessoas por cidades mais justas, democráticas e populares.
O Movimento Ocupe Estelita, defendendo uma cidade verdadeiramente popular, articula há cerca de três anos debates nas redes sociais, ocupação intensa dos espaços públicos, atuação jurídica e atos e ocupações de rua, especialmente no Cais José Estelita. O Cais trata-se de uma ampla área histórica estrategicamente localizada no centro do Recife, uma das últimas frentes d’água não edificadas da cidade que, ademais, tem enorme potencial para a integração urbana e teve em 2008, 10,1 hectares (o equivalente a 10 campos de futebol), originalmente pertencentes à RFFSA, leiloados para iniciativa privada sem vinculação a qualquer processo de planejamento urbano.
O projeto nomeado “Novo Recife”, proposto para a área por um Consórcio formado pelas empresas Moura Dubeux, Queiroz Galvão, GL Empreendimentos e Ara Empreendimentos, promete a suposta “revitalização” do centro da cidade. Entretanto, o projeto materializa-se de forma extremamente segregadora e agressiva, uma vez que propõe a construção de 15 torres com cerca de 40 andares cada, constituídas em meio a edifícios garagens, que preveem estacionamento para mais de 5000 carros e quarteirões cercados por guaritas e segurança privada, alheios às ruas e à frente d’água.
Se construído, o “Novo Recife” intensificará diversos problemas endêmicos da cidade que se manifestam no Cais, como a segregação social, a péssima mobilidade urbana, o desrespeito à memória e à paisagem, a falta de equipamentos públicos e áreas de lazer que dialoguem com seu entorno, que é possuidor de um grande déficit habitacional e de clara desigualdade social, além do que, alavancará extrema pressão fundiária sobre as áreas populares vizinhas, sobretudo por ser, o Cais José Estelita, uma estratégica área de ligação da cidade. Tudo que seja ali construído terá um impacto intensificado sobre todo o Recife.
O processo de aprovação do projeto é atualmente questionado por duas Ações Civis Públicas, por parte do Ministério Público Federal e do Ministério Público Estadual e três Ações Populares que levantam diversas irregularidades desde o leilão em 2008, até a análise pelo Conselho de Desenvolvimento Urbano em 2012, passando pela falta do plano urbanístico para a área, que é exigido em lei específica, de Estudos de Impacto Ambiental e de Vizinhança obrigatórios e de efetiva participação popular. Até hoje, nenhuma das cinco ações em que o projeto Novo Recife é réu teve sentença, portanto, todas ainda aguardam julgamento.
O total desrespeito cometido pelas empresas Moura Dubeux, Queiroz Galvão, GL Empreendimentos, Ara Empreendimentos e pela Prefeitura do Recife permitiu a consideração e aprovação de um projeto que a população do Recife ou não conhece, ou não aceita. Com um alvará irregular, o Consórcio iniciou no dia 21 de maio de 2014 a demolição dos históricos galpões de açúcar do Cais. A reação foi imediata: as pessoas preocupadas com o futuro da cidade ocuparam o terreno visando impedir a apropriação elitista e unicamente pautada no lucro, conseguindo, enfim, evitar a conclusão da demolição, provocar o embargo da obra por recomendação federal, através do IPHAN e do Ministério Público e iniciar uma negociação com a Prefeitura do Recife para a revisão do projeto. A morosidade da justiça é um fator com o qual os empresários contam para execução de um projeto ilegal.
A mobilização tomou proporções internacionais. Transformando o Cais em um local de debate, formação política, manifestação cultural e de exercício democrático popular. O Ocupe Estelita demonstrou sua força ao enfrentar os problemas vividos cotidianamente no Recife e fez confluir diversos outros movimentos e suas lutas, tais como o combate às opressões; as lutas por moradia, o direito à cidade e de gênero; o debate sobre os efeitos do neodesenvolvimentismo, a abordagem de grupos em situação de fragilidade social e adicção; os resquícios do Regime Militar na máquina pública do Brasil atual etc.
No dia 17 de junho, quando ocorreu o jogo do Brasil na Copa da FIFA, o movimento foi surpreendido com uma ação policial truculenta, que a pretexto do cumprimento de uma ordem judicial, deixou dezenas de pessoas feridas, com balas de borracha, gás de pimenta, chicotadas, golpes de cassetetes e bombas de efeito moral, trazendo claramente à tona a criminalização dos movimentos sociais no Estado Brasileiro hoje e os efeitos nocivos de sua militarização. A ação violenta, entretanto, ocorreu ainda fora dos limites territoriais da decisão que servia de pretexto à ação da polícia e durante todo o dia, mesmo após a reintegração de posse do terreno já ter sido concluída. Acordos firmados com o Governo do Estado de Pernambuco para garantir que eventual cumprimento de ordem judicial seria avisado e acompanhado da presença do Ministério Público foram desrespeitados. Os advogados e as advogadas do Movimento Ocupe Estelita foram impedidos de acompanhar o cumprimento da ordem, ao passo que os do Consórcio, escoltavam toda a ação. É importante registrar que a esta se soma a uma série de outros ataques que já vinham acontecendo e sendo divulgados: perseguições políticas, espionagem virtual e ameaças a diversas pessoas que militam a favor do movimento.
Comprovando a ideologia por trás desse empreendimento, após a reintegração de posse, a área do Cais José Estelita – a partir da ocupação, um espaço tomado de uma vida pulsante, popular e política – tornou-se, por decisão autoritária das empreiteiras, um verdadeiro campo de concentração com arame farpado, cães de guarda, câmeras de segurança, e dezenas de guardas armados.
Apesar da violência policial sofrida e de todos os desafios em conduzir um movimento custeado apenas por autogestão popular, frente a um projeto bilionário e uma estrutura perversa de poder, o Movimento ocupou a área debaixo do Viaduto Capitão Temudo e continuou resistindo. A ocupação manteve-se e ampliou o convite à cidade para discutir o projeto “Novo Recife” e a destinação do espaço urbano.
Entendendo o Cais José Estelita como uma metáfora do crescimento do Recife e de diversas outras cidades brasileiras e por lutar pela garantia de uma cidade que seja partilhada por todas as pessoas, o Movimento Ocupe Estelita aponta como pauta objetiva a anulação dos procedimentos administrativos que aprovam o “Projeto Novo Recife”, uma vez que os mesmos encontram-se repletos de irregularidades, exigindo o cumprimento fiel das leis, como o parcelamento prévio do solo, a aplicação do Plano Diretor de 2008 e a efetivação da participação popular, indispensável para a discussão de qualquer projeto para uma região tão relevante para a cidade. Como também, a realização do plano urbanístico previsto para área do Cais pelaLei municipal de nº 16.550/2000 e que nunca foi feito.
Considerando a relevância da luta pela democratização da cidade;
Considerando a luta contra a predominância dos interesses da iniciativa privada sobre os de ordem pública, especialmente com a disponibilização de territórios da união para empreendimentos privados;
Considerando a luta contra a criminalização dos movimentos sociais;
Considerando o Movimento Ocupe Estelita como legítima expressão dos anseios de amplos setores da cidade do Recife e da sociedade brasileira como um todo;
Assinam este manifesto:
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- Action Aid
- Ação Darmata
- Agência de Talentos de Pernambuco
- Amigos da Terra – Amazônia Brasileira (SP)
- ANCED – Associação Nacional dos Centros de Defesa de Direitos de Criança e Adolescente – Seção DCI Brasil
- Articulação Caminhada de Terreiro de Pernambuco
- Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa – ANCOP
- Articulação Nacional dos GTs de Urbana da AGB
- Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-Metragistas, Seccional PE/Associação Pernambucana de Cineastas – ABD-APECI
- Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo – ABEA
- Associação de Rádios Públicas do Brasil – ARPUB
- Associação dos Geógrafos Brasileiros – AGB
- Assembleia Nacional de Estudantes Livres – ANEL
- Associação Pernambucana de Defesa da Natureza – ASPAN
- Auçuba – Comunicação e Educação
- Articulação Caminhada de Terreiro de Pernambuco
- Biodiverso Soluções
- Casa da Cultura Digital Porto Alegre
- Casa da Mulher do Nordeste (PE)
- CCBG – Cena Cultural Do Baixo Gávea
- Central dos Movimentos Populares – CMP
- Central Sindical e Popular – CSP Conlutas
- Centro Acadêmico André da Rocha Direito/UFRGS – RS
- Centro Acadêmico Silvio Romero Direito/UFS – SE
- Centro Acadêmico Tobias Barreto Direito/UNIT – SE
- Centro das Mulheres do Cabo (PE)
- Centro de Cultura Professor Luiz Freire – CCLF
- Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Distrito Federal – CEDECADF
- Centro de Direitos Econômicos e Sociais – CDES (RS)
- Centro de Estudos e Articulação e Referência em Assentamentos Humanos – CEARAH Periferia (CE)
- Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social – CENDHEC
- Centro Popular de Direitos Humanos – CPDH
- Coletivo de Luta Comunitária – CLC
- Coletivo Inimigxs do Rei – UFPE
- Coletivo Marcha das Vadias – Recife
- Coletivo Midia NINJA (SP)
- Coletivo MUDA
- Coletivo Nigéria (Fortaleza)
- Coletivo Projetação
- Coletivo ZOADA
- Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco
- Comitê Popular da Copa de Pernambuco
- Comitê Popular da Copa de Porto Alegre (RS)
- Comitê Popular dos Atingidos Pela Copa de Belho Horizonte – COPAC-BH
- Comunidade Lauro Vieira Chaves (Fortaleza).
- Conectas Direitos Humanos
- Conselho Regional de Serviço Social – CRESS/PE
- Coordenação Nacional da Central de Movimentos Populares – CMP
- Coordenação Nacional da Confederação Nacional das Associações de Moradores – CONAM
- Coordenação Nacional da União por Moradia Popular – UNMP
- Coordenação Nacional do Movimento Nacional de Luta pela Moradia – MNLM
- Defesa Pública da Alegria (RS)
- Diaconia
- Direitos Urbanos Recife – DU
- Diretório Acadêmico de Ciências Sociais – UFPE
- Diretório Central de Estudantes da UNICAP
- Diretório Central de Estudantes da FAFIRE
- Diretório Central de Estudantes da UFRPE
- Diretório Acadêmico de Ciência Política (DACP) – UFPE
- Diretório Acadêmico de História Francisco Julião – UFPE (DAHISF- UFPE)
- Diretório Acadêmico Fernando Santa Cruz Direito – DEFESC/UNICAP
- ECOSBRASIL- Associação Ecológica de Cooperação Social
- Em Cena Arte e Cidadania
- Equipe Técnica de Assessoria, Pesquisa e Ação Social – Etapas (PE)
- Escambo Coletivo
- Escola Comunitária de Artes e Reforço Escolar – ECARE
- FAOC – Fórum da Amazônia Ocidental (AM)
- FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
- FNA – Federação Nacional de Arquitetos e Urbanistas
- Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Pernambuco – FETAPE
- Federação Interestadual dos Sindicatos de Engenheiros – FISENGE
- Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura – FeNEA
- Federação Nacional do Estudantes de Direito – FENEDE
- Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal – FENAE
- Federação Pernambucana de Cineclubes – FEPEC
- Frente de Luta Pelo Transporte Público PE
- Frente Independente Popular de Pernambuco – FIP/PE
- Fórum Amazonense de Reforma Urbana
- Fórum de juventude Negra de Pernambuco
- Fórum Estadual de Reforma Urbana do Rio Grande do Sul
- Fórum Pernambucano de Comunicação – FOPECOM
- Fórum Sul de Reforma Urbana
- Fórum Urbano da Amazônia Ocidental – FAOC
- Frente Quilombola (RS)
- Fundação Centro de Defesa de Direitos Humanos Bento Rubião (RJ)
- Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares – GAJOP (PE)
- GESTOS-Soropositividade, Comunicação e Gênero
- Giral – Comunicação e Juventude
- Greenpeace Brasil
- Grupo Cactos – Comunicação e Gênero
- Grupo de Trabalhos em Prevenção Posithivo – GTP+ (PE)
- Grupo João Teimoso
- Grupo Mulher Maravilha
- Habitat para Humanidade Brasil
- Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
- Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE (RJ)
- Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero – ANIS
- Instituto dos Arquitetos do Brasil no Rio Grande do Sul – IAB (RS)
- Instituto Terra, Trabalho e Cidadania – ITTC
- Levante Popular da Juventude/PE
- Mídia Lunar
- MisturAtiva
- Movimento de Assessoria Juridica Universitaria Popular – MAJUP
- Movimento de Luta pelo Teto – MLT (PE)
- Movimento de Luta Popular e Comunitária – MLPC (PE)
- Movimento de Moradia Popular de Pernambuco – MMPE (PE)
- Movimento Ecossocialista de Pernambuco – MESPE
- Movimento Nacional de Direitos Humanos/PE
- Movimento Nacional de Luta pela Moradia – MNLM-BR
- Movimento Negro Unificado – Pernambuco
- Movimento Sarau Debaixo – SE
- Movimento dos Conselhos Populares (Fortaleza)
- Movimento dos Trabalhadores Sem Teto – Pernambuco
- Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Desenvolvimento e Região (D&R) – UFPE
- Núcleo de Estudos Eleitorais, Partidários e da Democracia (NEEPD) – UFPE
- Núcleo Educacional Irmãos Menores Francisco de Assis – NEIMFA
- Observatório das Metrópoles (RJ)
- Observatório Transdisciplinar das Religiões no Recife
- Organização e Luta dos Movimentos Populares – OLMP (PE)
- Plataforma Dhesca Brasil
- Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais (SP)
- Ponto de Cultura Espaço Livre do Coque
- Praias do Capibaribe
- Rede Coque Vive
- Rede de Jovens do Nordeste
- Rede Jubileu Sul / Brasil
- Sambada Coco dos Amigos
- Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões
- Sindicato dos Metroviários de Pernambuco
- Sindicato dos Rodoviários do Recife e Região Metropolitana do Recife
- Sindicato dos Trabalhadores do Comercio Informal do Recife – SINTRACI
- Sociedade das Jovens Negras de Pernambuco
- Sociedade de Apoio à Luta pela Moradia SAM/MNLM – BR
- SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia (PE)
- Terra de Direitos
- União dos Estudantes Secundaristas de Pernambuco – UESPE
- União da Juventude Comunista (UJC)
- Unidade Classista Luta por Moradia (Fortaleza)
- Vídeo nas Aldeias
Ações: Direito à Cidade
Eixos: Terra, território e justiça espacial