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Nota: “Vale Tudo” em Terra Indígena, Não!


Foto: Dan Agostini / Mídia NINJA

A bancada ruralista tentará votar na tarde desta quarta-feira (23), na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado, a proposta que cria o marco temporal para demarcação de territórios indígenas. A medida também é avaliada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e tem recebido fortes posicionamentos contrários a proposta pela sociedade civil e instituições do Estado ligadas ao meio ambiente. Em nota, mais de 300 organizações, entre elas a Terra de Direitos, cobram acordo feito com o presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) de não apressar o debate em um tema que gera tantos impactos para a sociedade brasileira.

Confira a nota completa.

“Vale Tudo” em Terra Indígena, Não!

As organizações abaixo assinadas repudiam veementemente o avanço do Projeto de Lei 2.903/2023 (anteriormente denominado PL 490/2007), que além de impossibilitar a demarcação de novas terras indígenas, afrouxa regras de proteção e permite instalação de grandes obras sem consulta às comunidades afetadas.

O PL 2903/2023, atualmente em análise na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) e sob a relatoria da senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), tem previsão de votação para esta quarta-feira, dia 23 de agosto. Caso seja aprovado, seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, subsequentemente, para votação no Plenário, prevista para o dia 5 de setembro.

Em entrevista à Globo News no dia 01 de junho de 2023, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que o projeto não terá tramitação em regime de urgência no Senado, explicitando que “não haverá apressamento para submeter [o texto] direto ao plenário no Senado Federal. Tanto que ele será despachado para as comissões, como foram todos os outros projetos em matéria de meio ambiente”.

No entanto, o projeto não foi submetido à Comissão de Meio Ambiente (CMA) ou mesmo à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), espaços que poderiam permitir diálogo tecnicamente embasado e mais amplo, envolvendo a participação ativa dos povos indígenas. A senadora Leila Barros (PDT-DF), presidente da CMA, afirmou que iria “solicitar à Casa e ao presidente [Rodrigo Pacheco] o envio [do texto] para que ele tenha o devido rito, inclusive para passar nas nossas Comissões”. E o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) apresentou requerimentos a Rodrigo Pacheco para redistribuir o projeto para as comissões de Assuntos Sociais (CAS), do Meio Ambiente (CMA) e dos Direitos Humanos (CDH), justificando que “negar à CAS este debate é passar a mensagem de que os interesses da população indígena não serão considerados durante o processo legislativo nesta Casa. O que se sustenta é que a única comissão com competência específica para opinar sobre proposições relativas à população indígena não será ouvida”.

O projeto em questão permite diversas arbitrariedades contra os povos indígenas e suas terras, que hoje protegem 24% do que restou de Floresta Amazônica e prestam um inestimável serviço ambiental a todos brasileiros, como a manutenção da regularidade de chuvas no Centro-Sul do país. Uma dessas arbitrariedades é permitir a retomada de "reservas indígenas" pela União a partir de critérios subjetivos, o que colocaria em risco imediato pelo menos 66 territórios, habitados por mais de 70 mil indígenas e com uma área total de 440 mil hectares. É importante mencionar que são terras já regularizadas e consolidadas e que essa possibilidade provocaria insegurança jurídica, violência e invasões com a expectativa de revisão de atos jurídicos perfeitos. Além disso, apresenta os seguintes retrocessos:

  • Aplica o “marco temporal” a todas as demarcações de Terras Indígenas, inviabilizando um processo que já é complexo e, muitas vezes, demorado.
     
  • Estabelece que a demarcação poderá ser contestada em todas as fases do processo administrativo, o que dificultaria sua finalização.
     
  • Dispensa atividades altamente impactantes (construção de estradas, hidrelétricas, linhas de transmissão, outros) da realização de consulta livre, prévia e informada às comunidades indígenas afetadas, contrariando determinação da Constituição Federal e de legislação internacional ratificada pelo Estado brasileiro.
     
  • Legaliza o arrendamento de terras indígenas (“parcerias rurais”) para o plantio de grandes extensões de monocultura, sem qualquer regra de proteção ambiental, estimulando um aumento significativo do desmatamento no país, sobretudo na Amazônia, onde se concentra 98% dos territórios indígenas.
     
  • Abre brechas para o fim da política de não contato com indígenas isolados, permitindo o contato em casos de “interesse público”, que poderia ser realizado por empresas e, inclusive, por associações de missionários.

Diante do exposto, solicitamos respeitosamente que o Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, cumpra com seu compromisso de garantir um debate adequado sobre tema tão relevante e, atendendo às solicitações de diversos senadores, organizações indígenas e da sociedade civil submeta o PL 2903/23 à análise das comissões de meio ambiente (CMA), de Direitos Humanos (CDH) e de Assuntos Sociais (CAS) para que possa haver uma análise tecnicamente qualificada de seus diversos aspectos e, sobretudo, para que seja ampliada a consulta aos povos indígenas, que serão diretamente afetados por essa mudança de regras.

Confira a lista completa de organizações que assinam a nota.



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