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PR: Agricultores agroecológicos reivindicam assinatura de decreto que garante 100% da merenda escolar orgânica


Documento elaborado por grupo de trabalho garante que futuras gestões governamentais se comprometam na implementação progressiva da merenda orgânica na educação pública. Previsão de sanção pelo governador é para agosto.

 

O texto é resultado da construção do Grupo de trabalho, colegiado composto por representantes do poder público, agricultores e sociedade civil. Foto: DivulgaçãoApós reivindicação de representantes de organizações da sociedade civil, o poder público do Paraná se comprometeu a manter o Plano de Introdução Progressiva de Produtos Orgânicos na Alimentação Escolar do Estado do Paraná como eixo central no texto do decreto a ser apresentado ao governador Ratinho Junior (PSD), nos próximos dias. A previsão é de sanção do documento é, de acordo com representantes do poder público, para o mês de agosto.

A presença do Plano vinculado ao Decreto, que regulamenta o fornecimento da merenda escolar orgânica para estudantes do Ensino Fundamental e Médio no estado, não apenas como uma referência, mas como eixo central para execução da política pública, retoma a versão original do texto elaborada pelo Grupo de Trabalho Intersetorial Estadual. O colegiado composto por 34 representantes de diversas pastas do poder público e da sociedade civil, entre eles a Terra de Direitos, e instituído em março de 2018, entregou ao Estado, ao final de ano passado, a minuta de regulamentação da Lei 16.751/2010.

Com quase dez anos de vigência, a Lei que determina a obrigatoriedade da merenda orgânica nas escolas públicas paranaenses até atingir a integralidade da rede pública de educação carecia de um passo a passo descrito em normativas estaduais para que saísse do papel. Delimitado para cumprimento em um período de tempo, o Plano Estadual contem objetivos, ações, metas e definição de órgãos responsáveis para a produção de alimentos de atenção ao meio ambiente e de atendimento ao direito à alimentação saudável – estendidos ao público das escolas. Organizado nestes termos, o documento é passível de monitoramento e avaliação pela sociedade civil e agricultores, por exemplo.

Com um documento em mãos, a Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento fez alterações a fim de dar uma “roupagem técnico legislativa” ao texto construído pelo Grupo de Trabalho, apontou o responsável pela Secretaria do Estado da Agricultura e do Abastecimento, Noberto Ortigara em reunião com os integrantes do GT. O Plano Estadual, nesse contexto, estava como um apêndice na nova redação da minuta do decreto. O lugar menos prestigiado conferido ao Plano, tido como documento estruturante da política de implementação da merenda orgânica, foi contestado pelo grupo. Após reivindicação do grupo para o secretario da Seab, Norberto Ortigara, e o presidente do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Educacional (Fundepar), José Maria Ferreira, o poder público assegurou que afirmação de que a política adotada deve ser nos termos previstos no Plano será reincorporada ao texto a ser enviado para sanção.

“A alteração que sugerimos [ao novo texto apresentado pelo poder público] e que foi acolhida é que a implementação progressiva da alimentação escolar agroecológica se dará nos termos no Plano. O Plano é aquilo que deve ser obedecido e não configurar apenas como mera referência dentre outras tantas”, destacou o procurador da Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça (Caop) de Proteção aos Direitos Humanos do Ministério Público do Paraná, Olympio Sotto Maior. “O Plano de Implementação reúne as competências e obrigações de todas os envolvidos no processo. Era fundamental que o Plano que estivesse vinculado ao processo de implementação”, complementa a presidente do grupo de trabalho, Maria Teresinha Ritzmann.

“Se tem um Plano eu posso estar cobrando das autoridades, orientando meu trabalho para as ações previstas, cobrando das organizações de como vou me inserir nas atividades”, diz o agricultor ecologista da Rede EcoVida, Marcelo Passos. O coordenador do Caop acrescente que, diante da não execução das ações prevista no Plano ou o não atendimento aos prazo o Estado terá que apresentar justificativa.

"A assinatura do decreto e a vinculação do plano de execução é um avanço para os agricultores agroecológicos e para as crianças do Paraná, vez que só que esse instrumento é possível haver ações práticas do poder público para elevar a transição agroecológica, valorizar os produtos orgânicos das unidades familiares com sobrepreço, destinar capacitação técnica para que as comunidades tenham aptidão para se inscrever nas chamadas públicas, tanto na produção quanto no setor administrativo que o processo exige, afirma a advogada da Terra de Direitos, Naiara Bittencourt, que participou da elaboração do decreto e do plano no grupo de trabalho.  

"Isto é, é uma política pública que favorece duas pontas essenciais ao olhar do poder público: os agricultores familiares agroecológicos, comunidades tradicionais e povos indígenas; e de outro, crianças e jovens que são setores mais vulneráveis à intoxicações por agrotóxicos e produtos químicos", complementa a advogada.

Integrantes do Grupo de Trabalho reunidos com o poder público reivindicaram a manutenção de pontos importantes presentes no texto elaborado pelo GT. Foto: Lizely BorgesApoio aos agricultores agroecológicos
Para garantir que a totalidade das escolas estaduais passe a fornecer alimentos orgânicos, com meta de cobertura integral até 2030, o Plano determina, entre outras ações, atividades para assistência técnica aos agricultores para conversão para modelo agroecológico, realização de pesquisas e auxilio para certificação dos produtores.

O Estado do Paraná vive uma crescente de evolução dos municípios que ofertam produtos agroecológicos – saltou de 29 em 2011 para 84 em 2017 (Dados Celepar). A participação dos orgânicos na merenda também evoluiu no últimos anos: de 6% dos alimentos adquiridos pelo Programa Estadual de Alimentação Escolar (PEAE) em 2011 para 14% em 2018 (Celepar). No entanto, é rapidamente identificável o extenso caminho a ser percorrido para cobertura dos 399 municípios paranaenses e uso exclusivo dos alimentos provenientes da produção agroecológica na merenda.

“Temos um histórico da evolução da compra de alimentos orgânicos dentro do Programa Estadual de Alimentação Escolar. Começou com 72 mil quilos em 2011 e em 2018 fechou com 1.8 milhões de quilos de produtos orgânicos. Houve avanço significativo”, relata Teresinha. Ela complementa que o estado figura entre o primeiro e segundo lugar no número de produtores certificados:  2.417 produtores certificados (Mapa) – contingente ainda distante há 370 mil produtores rurais ativos no estado.

Para o agricultor Marcelo Passos, além das previsões de assistência técnica e auxilio à conversão do modelo tradicional para a agricultura orgânica previstos no Plano, a meta de ampliação de atendimento às escolas cria um esteio seguro para investimento dos produtores nesta via.

“A dificuldade do agricultor sempre é: eu vou produzir e vou vender onde? No momento em que eu tenho o canal, que eu sei que vou comercializar durante o ano todo num preço que sei qual é, isso traz uma tranquilidade porque sei que uma parte da minha produção já está vendida, e as outras partes eu posso buscar outros canais”, relata.

Para abastecer regulamente o Programa Estadual de Alimentação Escolar, orientado para disponibilização de alimentos orgânicos, há previsão de que cerca de 10 a 12 mil produtores tenham que produzir alimentos agroecológicos e orgânicos no Paraná. “O impacto do Plano vai ser em todos esses produtores que estão produzindo já dentro de manejo ecológico. As comunidades tradicionais, pequenos agricultores, os agricultores com menos renda e menos acesso a tecnologias de produção é que vão ser mais beneficiados porque eles já estão fazendo manejo sustentável e vão passar a ser reconhecidos com selo de certificação”, explica Teresinha. O texto do decreto prevê que o produtor em regime de conversão pode oferecer, no prazo de até dois anos, alimentos ao Programa Estadual com a gratificação de bônus de 10% sobre o preço do alimento convencional. Após ser certificado, o produtor deve receber um bônus de 30%.

Merenda orgânica como ação de resistência
A adoção de merenda escolar integralmente composta por alimentos orgânicos é uma discussão que ganha corpo no país. Em recentes manifestações do Mapa, a ministra Teresa Cristina (DEM) relatou que os municípios devem ser estimulados na produção de alimentos orgânicos para destinação para merenda. Municípios como Porto Alegre (RS), São Paulo (SP) e Marechal Cândido Rondon (PR) já dispõem de leis em vigor sobre alimentação orgânica escolar, por exemplo.

A manifestação da ministra, no entanto, tem ido na contramão de criação de uma produção de alimentos efetivamente saudável: em duzentos dias do governo sob comando de Jair Bolsonaro e, da pasta da agricultura pela ruralista Teresa Cristina, foram autorizados 239 agrotóxicos no Brasil.

Neste sentido, a constituição de uma normativa que fortaleça a agricultura de base agroecológica, voltada para a produção de alimentos possui ainda maior importância. "A política, nesse contexto, vai na contramão do panorama nacional de incentivo massivo à aplicação de agrotóxicos. Mas é preciso ter em conta que se as liberações e ausência de fiscalização desses produtos agroquímicos continuarem nesse ritmo que estamos, também há consequências inestimáveis aos agricultores agroecológicos, seja pela contaminação do solo, mas sobretudo pela contaminação da água e do uso exacerbado de propriedades circunvizinhas", lembra Naiara Bittencourt. 

Participação popular
Outro trecho que deve ser reincorporado ao texto do decreto diz respeito à participação social no monitoramento do Plano. No texto apresentado pelo poder público foram suprimidos os trechos que reservavam assentos para representantes da sociedade civil e agricultores no Comitê Gestor.

Fortemente defendido pelos integrantes do Grupo de Trabalho, o Secretário se comprometeu a incluir o texto ao decreto que assegura a participação de um representante da sociedade civil do Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar (CEDRAF) no Comitê. “A participação da sociedade foi fundamental na formulação do Plano e deve ser fundamental na implementação das ações previstas nele”, defendeu o procurador Dr. Olimpio.

Para Teresinha o objeto do decreto – o alimento limpo e saudável para a rede pública – é defesa histórica da sociedade. “É uma construção de muito tempo e muito importante, principalmente da sociedade civil que vem pautando o modelo da agroecologia, do alimento limpo e saudável, da aproximação campo e cidade. São muitas lutas que estão sendo contempladas nesta regulamentação”, finaliza.

 



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