Em meio à fumaça que sufoca Santarém (PA), indígenas e quilombolas se mobilizam para debater a crise climática
Lanna Paula Ramos
As ações de formação estão sendo realizadas como parte da preparação para a COP 30, que acontecerá em Belém do Pará em 2025
Entre os dias 22 e 24 de novembro, cerca de 150 quilombolas de Santarém, no oeste do Pará, participaram do 3º Aquilombar na Amazônia e 19º Encontro das Comunidades Quilombolas do município no Quilombo de Arapemã, na margem oposta do rio Amazonas. O evento, que celebrou o Dia Nacional da Consciência Negra, também se dedicou a debates sobre os impactos da crise climática nos territórios tradicionais.
A roda de conversa, mediada pela Terra de Direitos, abordou as mudanças climáticas e a Conferência do Clima da ONU (COP30), prevista para ocorrer no Pará em 2025. Além dos quilombolas, povos indígenas do Território Borari, em Alter do Chão, também organizaram atividades de formação para discutir a crise climática e seus impactos
Há quase dois meses a população de Santarém, no oeste do Pará, convive diariamente com densas nuvens de fumaça oriundas de incêndios e queimadas em áreas e municípios próximos, como Prainha, Porto de Moz, Belterra e Mojuí dos Campos. No domingo (24), a cidade paraense registrou um Índice de Qualidade do Ar considerado péssimo para as pessoas, de acordo com o aplicativo AirVisual. Diante disso, nesta segunda-feira (25), a Prefeitura de Santarém decretou situação de emergência ambiental no município.
Em paralelo à essa situação, povos indígenas e quilombolas de Santarém têm se articulado e mobilizado espaços formativos e de discussão do tema da crise climática, seus impactos aos territórios e sobre a Conferência do Clima da ONU (COP30), que terá a 30ª edição realizada no Pará em 2025. A Terra de Direitos tem contribuído com os debates, mediando formações e palestras sobre o tema.
A Associação de Mulheres Indígenas Suraras do Tapajós está realizando, durante o mês de novembro, uma formação voltada a educação climática para mulheres e jovens indígenas no Território Indígena Borari, localizado no distrito de Alter do Chão. Com o nome “Clima de Ação: Educação Climática e Incidência Política para proteção territorial”, a iniciativa ocorre aos sábados na sede da associação, reunindo participantes em oficinas e palestras facilitadas por convidados.
Segundo Estefane Galvão, diretora de gênero e clima da Associação de Mulheres Indígenas Suraras do Tapajós, a iniciativa da formação de educação climática surgiu com o objetivo de garantir que mais pessoas no território tivessem acesso ao tema das mudanças climáticas para a defesa do território e para ocupar espaços como os das Conferências Mundias sobre Clima da ONU. “É importante a gente colocar essas pessoas como protagonistas nessas discussões, nos espaços de Conferências e nessas temáticas. A gente sabe que nós somos os que menos contribuem para as mudanças climáticas e os que mais sofrem. Muitas das vezes a gente não sabe o porquê disso. Então a formação surge para que essas pessoas estejam inseridas nesse conhecimento, para saber quais as políticas climáticas, quais são nossos direitos e utilizar ferramentas como o advocacy, ativismo e a comunicação para defesa do território. Para que a gente possa ter um território que lute contra os impactos climáticos, como um território vivo”, declarou.
No dia 16 de novembro, aconteceu o segundo encontro da formação. A conversa com jovens e mulheres indígenas foi mediada pela Terra de Direitos e pelo Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM) e abordou o uso da terra e das florestas na Amazônia. O debate destacou os impactos dos grandes projetos, agronegócio e mineração na intensificação dos efeitos das mudanças climáticas.
Alexandre Arapiun e Selma Corrêa, da equipe de assessoria jurídica da Terra de Direitos, desenvolveram uma dinâmica para tratar sobre o tema da crise climática, direitos humanos e justiça climática. Para Selma, a formação dos povos e comunidades tradicionais é uma das estratégias necessárias para incentivar o protagonismo nos territórios em busca da justiça climática.
“O discurso sobre o clima chega nos territórios tradicionais com uma carga alta de termos técnicos e complexos, o que dificulta a compreensão sobre a temática. Nesse sentido, a educação popular por meio de formações e oficinas, tem contribuído para colocar comunidades e povos tradicionais como protagonistas do debate climático, pensando em ações estratégicas a partir da realidade de seus territórios, que já estão sendo diretamente impactados pela crise climática”, enfatizou a assessora jurídica.
Impactos socioambientais por empresas
Os estudos Portos no Tapajós e Sem Licença Para Destruição: Cargill e a violação de direitos humanos no Tapajós, elaborados pela organização, foram apresentados pela comunicadora Lanna Paula Ramos para tratar sobre os impactos do agronegócio na região do Tapajós e sobre estratégias de comunicação e advocacy para resistência dos territórios.
Com os impactos do clima, como a seca, estiagem e as queimadas, fazendo parte do dia a dia também dos quilombos do município, as comunidades têm se mobilizado em torno do tema do clima - assim como os povos indígenas. A Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS) - que representa as 13 comunidades quilombolas da região - decidiu incluir o tema como programação no 3º Aquilombar na Amazônia e 19º Encontro das Comunidades Quilombolas do município, ocorridos simultaneamente.
Railan Lima, jovem quilombola de Murumuru, contou que ter um momento de roda de conversa tratando sobre os efeitos da mudança climática é essencial, principalmente nesse encontro que reúne quilombolas de todas as idades e comunidades. “Trazer esse tema para as comunidades nesse encontro em que todas as comunidades estão reunidas é de suma importância. Até porque estão jovens, adultos e idosos, crianças. São todos em um mesmo espaço para debater em conjunto. Repassar as informações e conhecimentos que os mais velhos têm e a nova geração não pôde ver, por exemplo, como era o território antes dos impactos das mudanças climáticas.”
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